ERRATA: Na edição impressa deste volume, o texto “Ansiedade, fatores de risco e práticas parentais: um caso de clínica escola” teve sua citação ABNT trocada erroneamente pelo do texto “Relato de experiência de estágio clínico na abordagem da Terapia Cognitivo Comportamental”. Favor considerar a versão apresentada a seguir:
ABNT — WILVERT, A. P., IAKUSCH, V. Ansiedade, fatores de risco e práticas parentais: um caso de clínica escola. CadernoS de PsicologiaS, n. 4, edição impressa, 2023.
Resumo: O presente artigo visa demonstrar as indagações de um terapeuta em formação, acerca de um caso de clínica escola na Universidade Campos de Andrade, onde as demandas iniciais eram relacionadas à ansiedade, relação com os pais e sentimentos de abandono, o que durante o processo terapêutico foi possível notar a presença de outros fatores como as práticas parentais negativas, gerando desta forma para o indivíduo modelos de esquemas disfuncionais, assim como crenças e pensamentos automáticos negativos relacionados a si. Com isso foi possível demonstrar de forma teórica e prática o surgimento deste domínio, além da efetividade da Terapia Cognitiva Comportamental para o tratamento na formulação de crenças e pensamentos mais adaptativos. Contudo, juntamente com os ganhos que o paciente obteve em terapia, se fez presente a ideia de que a formação clínica do graduando em Psicologia ocorre de maneira contínua, não se limitando apenas ao meio acadêmico, mas como um todo.
Palavras-chave: Terapia Cognitiva Comportamental, Ansiedade, Práticas Parentais.
ANXIETY, RISK FACTORS AND PARENTING PRACTICES: A SCHOOL CLINIC CASE
Abstract: This article aims to demonstrate the questions of a therapist in training, about a case of a school clinic at Campos de Andrade University, where the initial demands were related to anxiety, relationship with parents and feelings of abandonment, which during the therapeutic process was It is possible to note the presence of other factors such as negative parental practices, thus generating dysfunctional schema models for the individual, as well as negative automatic beliefs and thoughts related to themselves. This made it possible to demonstrate in a theoretical and practical way the emergence of this domain in addition to the effectiveness of Cognitive Behavioral Therapy for the treatment of formulating more adaptive beliefs and thoughts. In this way, together with the gains that the patient obtained in therapy, the idea that the training of the therapist in training occurs continuously, not limited only to the academic environment, but as a whole, became present.
Keywords: Cognitive Behavioral Therapy, Anxiety, Parental Practices.
ANSIEDAD, FACTORES DE RIESGO Y PRÁCTICAS FAMILIARES: UN CASO CLÍNICO ESCOLAR
Resumen: Este artículo tiene como objetivo evidenciar las interrogantes de um terapeuta em formación, sobre um caso de uma clínica escolar de la Universidad Campos de Andrade, donde las demandas iniciales estaban relacionadas com la ansiedad, la relación com los padres y los sentimientos de abandono, que durante el proceso terapéutico fue Es posible notar la presencia de otros factores como prácticas parentales negativas, generando así modelos de esquemas disfuncionales para el individuo, así como creencias y pensamientos automáticos negativos relacionados com uno mismo. Esto permitió demostrar de manera teórica y práctica el surgimiento de este dominio además de la efectividad de la Terapia Cognitivo Conductual para el tratamiento de la formulación de creencias y pensamientos más adaptativos. De esta manera, junto a los logros que el paciente obtuvo em la terapia, se hizo presente la idea de que la formación del terapeuta em formación se da de manera continua, no limitada sólo al ámbito académico, sino como um todo.
Palabras-clave: Terapia Cognitivo Conductual, Ansiedad, Prácticas Parentales.
Introdução
Quando pensamos na nossa formação base da psicologia, uma das principais experiências práticas que perpassam pelo processo acadêmico, seria o estágio específico onde o aluno realiza seus primeiros atendimentos em uma clínica escola, conforme as normas estabelecidas pelo Conselho Regional de Psicologia – CRP. Desta forma, este estudo se propõe ao relato de um processo de psicoterapia, onde 17 sessões foram realizadas, com base na Terapia Cognitiva Comportamental, que de certa forma, visa demonstrar a evolução do quadro clínico do paciente, assim como as próprias indagações do terapeuta em treinamento orientado por supervisão.
A demanda recebida se trata do paciente Sr. J de 29 anos, cujo os dados de identificação pessoal são fictícios. No início sua procura ao serviço de atendimento clínico estava ligada a demandas de ansiedade e insônia, ao qual traziam prejuízos em seu bem estar no dia a dia. Durante este primeiro encontro, com a realização do acolhimento e psicoeducação de como ocorre a terapia, algumas outras metas também foram identificadas como forte sentimento de culpa, que surgiam com certa frequência em seus discursos, assim como sentimentos de abandono, baixo nível de autonomia em reconhecer e tomar decisões, além da relação com os seus pais, que em primeiro momento, sua caracterização foi a do pai rigoroso e a mãe com práticas de supervisão relaxada.
Contudo, ao longo do processo terapêutico, conforme as sessões foram ocorrendo, foi observado que parte da ansiedade de Sr. J poderia estar ligada por um conjunto de causas internas e não a um transtorno mental, sendo de caráter situacional devido à dificuldade em lidar com conflitos e evitar isso, optando por comportamentos de evitação, além de inibição ao se expressar verbalmente, como uma repressão.
Metodologia
O paciente foi atendido durante 17 sessões em uma clínica escola, da Universidade Campos de Andrade, tendo um intervalo de uma semana entre um encontro e outro. Ao início do atendimento após o acolhimento, foram definidas metas para se trabalhar em terapia, realizando uma estruturação dos conteúdos a serem abordados. Vale ressaltar que o caso era acompanhado por supervisão.
Com base nos dados iniciais levantados nesse primeiro encontro, uma reflexão e até hipótese diagnóstica formulada, foi sobre como os estilos de práticas parentais podem influenciar na formação do sujeito adulto. Pensando nisso, Jeffrey Young (1950), juntamente com Janet S. Klosko e Marjorie E. Weishaar, publicaram o livro Terapia dos Esquemas, ao qual se encontra disponível pela editora Artmed (2003). Nele os autores além de estabelecerem essa relação entre os estilos de cuidados, também falam sobre a formação de padrões de necessidades básicas as quais o indivíduo adquire, sendo definidas como esquemas, podendo ser maneiras adaptativas a realidade externa ou não.
Ao realizar essa primeira análise e segundo o relato de Sr. J, uma primeira leitura seria que seus conflitos com um baixo nível de autonomia, a natureza de alguns de seus conflitos emocionais e a sua relação com seus pais, teriam como origem o conjunto de práticas ligadas ao seu desenvolvimento. Segundo Young et al. (2003), ao descrever os modelos de práticas parentais, se estabelece 5 domínios, onde os sentimentos de abandono possuem relação com o campo de privação/frustração de necessidades, desta forma, neste campo houve um déficit em compreensão, amor ou estabilidade.
Inicialmente, com a realização de uma entrevista de anamnese, foi possível realizar de forma mais efetiva a conceituação de como Sr. J. percebia sua ansiedade, além de entender outros padrões de comportamentos relevantes que poderiam estar associados ao estilo de práticas parentais vivenciados em seu desenvolvimento. Contudo, com a coleta de dados, o discurso do paciente se volta a descrever sua mãe como controladora, e em seguida adicionando “não gosto de ser comparado” (SIC). Seu pai, além de ser uma pessoa rigorosa, tinha como o hábito de atribuir a culpa dos erros ao seu filho; já quando algo dava certo, o mérito era tido para si. Dentro desta dinâmica descrita pelo paciente, e pela observação de seus relatos, foi possível notar um comportamento em si voltado a agradar ao próximo, como um direcionamento ao outro sobre suas próprias escolhas ou responsabilidades, o que refletia em uma baixa permanência em empregos e dificuldade em estabelecer relacionamentos amorosos saudáveis. Para Baurmrind (1966), pais autoritários costumam ser rígidos e tendem a enfatizar a obediência e o respeito, usando até mesmo de violência física quando estes limites são contraditos. Desta forma, os sentimentos e a autonomia da criança não são levados em conta, pois seus genitores não aceitam questionamentos, tornando uma deficiência nesse sentido, o que pode levar o sujeito adulto a ter dificuldades em estabelecer comunicações assertivas, e também reconhecer suas próprias necessidades e emoções, ao qual podemos definir como um domínio de limite prejudicado ao usar a obra de Jeffrey Young (2003) como referência . Sobre a ansiedade de Sr. J., foi possível analisar que surgia através de pensamentos automáticos aos quais o paciente tinha sobre si, como “se sentir fracassado” e “se sentir inútil”, que surgiam com certa frequência em sua cabeça, visto que nesse momento o cliente em questão tinha acabado de iniciar em um novo emprego e estava em fase de adaptação e treinamento. Assim, seu medo era o de cometer erros e ao pensar em fazer alguma coisa errada nesse sentido, os pensamentos surgiam, o que pode estar associado a uma baixa autoestima ou um conjunto de crenças negativas sobre si. Esse conceito é entendido como: “não é a situação em si que determina as emoções do sujeito, mas sim a maneira como elas são interpretadas.” ( Beck, 2013 P.51). Dessa forma, entende-se que os pensamentos automáticos de Sr. J. geravam a ansiedade situacional e inseguranças próprias no ambiente de trabalho, o que se prolongava principalmente durante a noite, que como consequência gerava o sintoma de insônia.
Durante este período, os principais conteúdos trabalhados foram seus relacionamentos amorosos, sua ansiedade, e de forma breve, melhor contextualização sobre sua relação com os pais. Desta forma Sr. J. descreve suas experiências amorosas como “relacionamentos relâmpagos” (SIC), onde ele afirma sempre doar mais do que receber e entrar em relacionamentos já vendo seu fim, além de apresentar uma visão negativa sobre onde sua definição é “decepção após decepção” (SIC). Além disso, descrevendo uma relação ao qual passou por um processo de abuso físico e psicológico por sua última companheira, ao qual contou a apenas dois amigos próximos, mas foi alvo de piadas externas pelo fato de sofrer a agressão da mulher, o que o levou a ter um bloqueio sobre o assunto, só falando sobre isso em terapia. Nesse sentido, ao fazer o retorno aos modelos de esquemas disfuncionais podemos entender essa relação como:
Este tipo de comportamento pode estar associado ao domínio de desconexão/rejeição mais especificamente no campo de abandono/instabilidade, onde o sujeito apresenta comportamentos de desconfiança em suas relações, crenças de que pode ser abandonado a qualquer momento e geralmente suas relações são instáveis e apresentam certo predomínio de desconfiança. (Young et al., 2003, p. 28)
O que reforça ainda mais essa hipótese é a descrição do paciente Sr. J., de que era uma crença associada de que após seus términos, a pessoa sempre encontrava outro parceiro. Outra possível hipótese é a de que devido a seus sentimentos de abandono, para não precisar sentir ou lidar com esse gatilho emocional, o cliente se sabota ou sabota sua companheira amorosa, para que seja gerado o término e desta forma ele não precise entrar em contato com essa emoção. Tendo como base a Terapia dos Esquemas, que pontua como “exemplos de resignação do abandono/instabilidade: escolhe parceiros com os quais não consegue estabelecer compromisso e se mantém no relacionamento.” (Young et al., 2008, p. 49). Articulando a literatura com os relatos de Sr. J., suas escolhas de relacionamentos amorosos eram voltadas a inícios disfuncionais, ao qual eram acompanhadas de grande emoção quando começado, mas, após pouco tempo, se iniciava uma fase de conflitos, chegando até mesmo a sofrer abuso psicológico e físico em um destes namoros. Geralmente suas trocas de parceira ocorrem de maneira rápida, com poucos meses de duração entre uma relação e outra. O paciente também relata se colocar em uma posição de cuidador, devido a repetidamente escolher parceiras passando por uma fase difícil e de esgotamento mental, se doando mais do que recebe.
Ao falar sobre relações amorosas e práticas parentais, o entendimento pode surgir segundos os autores, Granja e Mota (2018) “essas duas instâncias estabelecem relação quanto aos estilos de vinculações na vida adulta, ocorrendo por dois fatores: exigência e responsividade”. Dessa forma foi possível também analisar uma distorção cognitiva de rotulação do paciente acerca da imagem feminina, se mostrando com o pensamento automático de que “mulher é uma desgraça” (SIC). Para Judith Beck (2013, p. 203) “a distorção cognitiva do tipo de rotulação ocorre quando o indivíduo atribui a si ou ao outro, um rótulo fixo ao qual ele não considera outras evidências, mas acredita nisso como um todo”. Desta forma, é possível entender que o caso do Sr. J. se trata de uma crença rígida, e que possui uma certa manutenção em sua vida, podendo ser levado a ter um padrão de uma busca por relacionamentos disfuncionais afim de reforçar essa crença, atendendo assim ao condicionamento do Esquema disfuncional de abandono, ao qual o indivíduo pode optar por fugir de laços amorosos, sendo necessário uma forte aliança terapêutica para se trabalhar essa distorção cognitiva. Sobre o entendimento de relacionamentos saudáveis, dizem os autores Gomes e Sá (2021) “Ao falar sobre as relações amorosas saudáveis se estabelece a ideia de alguns domínios como: consulta ao parceiro(a) ao tomar decisões, capacidade de lidar com conflitos, boas habilidades de comunicação e se apoiar em valores como equidade, respeito, compreensão e confiança.”
Ao analisar o quadro sintomático de ansiedade relatado por Sr. J., se entende uma relação entre uma vulnerabilidade mental e psicológica relacionada aos seus estilos de práticas parentais e fatores de risco. O paciente relatou que no ano de 2018 teve “crises de surto” (SIC), aos quais nunca teve antes e que isso ocorreu por meio dos eventos vivenciados no ano em questão, descritos como: a morte de seu primo, a perda da renda do pai, endividamento, término de um relacionamento, se tornar cuidador de uma parente próxima que tenha um quadro de transtornos mentais e a morte de seu tio, ocorrida no ano seguinte. O paciente fala sobre ter desenvolvido os sintomas de ansiedade após esses eventos, surgindo por meio de pensamentos negativos sobre si. Dessa forma, se entende a ansiedade como multifatorial, tendo como origem uma série se fatores de diferentes naturezas. Segundo o modelo cognitivo, os autores Clark e Beck (2012), entendem que a os indivíduos tendem a superestimar situações de perigos, com uma avaliação de riscos onde subestimam o real e a suas capacidades de enfrentamento.
Nesse período duas novas demandas emergentes surgiram, como uma dificuldade do paciente em lidar com um conflito gerado em seu espaço religioso, ao qual ele se sentia incomodado pelo local, devido a presença de algumas pessoas e também uma inquietação por não conseguir emprego em sua área de formação, a enfermagem. Contudo, ao falar sobre os conflitos ligados ao local de sua espiritualidade, um fator que se destacava era a presença de uma amiga no mesmo ambiente, que se tratava de uma figura importante para o paciente, mas que no momento ambos estavam afastados. Sua amiga, que iremos chamar de Sr(a). S., foi quem o introduziu para sua nova religião e o ajudou a lidar com os conflitos gerados por seu último relacionamento amoroso. Diante disso, ele afirmava querer deixar ou se mudar do local, por não se sentir bem, mas ao mesmo tempo não conseguia ter uma conversa com seu líder religioso, sustentado pelo pensamento automático de que “estaria sendo uma pessoa ingrata” (SIC).
Durante as sessões, foi confrontado o paciente sobre a ansiedade experimentada sobre os eventos atuais, com o uso de perguntas objetivas e técnicas, levando ele a pensar sobre suas crenças através do questionamento socrático, em que Santos e Medeiros (2017, p. 4) pontuam que “a técnica de questionamento socrático possui como objetivo modificar crenças e pensamentos disfuncionais, de maneira a levar o indivíduo a uma reflexão de si”.
Houveram duas ausências em sessões, sendo na décima segunda e décima quarta sessão. Nesse período, Sr. J. havia tentado conversar com sua amiga, mas sem sucesso no contato, descobrindo também que ela iria fazer uma viagem para fora do país, por conta de uma proposta de emprego. Quando soube, pensou em se despedir, enviou uma mensagem para ela, mas ao mesmo tempo arquivou as conversas para que não visualizasse sua resposta, faltando também nos encontros espirituais durante a semana, só retornando após sua saída. Depois de dias, ao verificar as mensagens, percebeu que ela respondeu de maneira positiva.
Com os eventos relacionados a saída de sua amiga do país, o paciente trouxe a necessidade de deixar de se afastar de sua religião por um tempo, no entanto, estava em dúvida, pois considerava como uma das coisas mais importantes e expressava dificuldade em ter uma conversa com seu líder.
Com isso, através do questionamento socrático e com a ressignificação do processo de exposição de suas emoções de maneira assertiva, falando sobre seus pontos e abrindo-se para ouvir o outro lado, o paciente conseguiu ter a conversa com seu líder, ao qual foi de maneira saudável, assim entendendo melhor suas emoções e como aquilo estava o afetando. Outra conclusão ao qual foi percebida em terapia, foi que seu sentimento de querer se afastar estava ligado a uma questão de sentimento de abandono, ao qual foi sentida pela ausência de sua amiga, Sr. J. Deste modo, ao realizar a confrontação com o paciente durante a sessão, e realizar uma psicoeducação sobre este comportamento, o mesmo conseguiu ter a percepção de que seu sentimento em querer deixar o local, estava ligado com sua perda de uma figura importante, que seria a de sua amiga, e isso ocorreu devido a identificação do esquema de abandono, o que após esse entendimento, sua decisão foi a de continuar no espaço religioso.
Outra demanda trabalhada com Sr. J. foi a sua necessidade em conseguir um emprego em sua área de formação, a enfermagem. Inicialmente o paciente levantou um debate sobre a difícil colocação no mercado de trabalho, como uma consequência da Pandemia do Covid 19. Seu discurso trazia a tona o cenário pós pandemia, onde houve uma redução de empregos, o que gerou diversas demissões e um melhor número de vagas em hospitais, com isso seu comportamento perante a este evento era o de procurar ex-colegas de faculdade que estavam passando pela mesma dificuldade. Desta forma, com o uso da técnica de questionamento socrático sobre como fazer o enfrentamento desta situação e quais eram suas alternativas, o paciente teve o entendimento de que precisava buscar outros meios para lidar com isso, e assim procurou ajuda profissional para criar um bom currículo e entrou em contato com professores de faculdade. A partir dessa ação, conseguiu emprego na área.
Devido as férias previstas em calendário acadêmico, foi realizado o processo de devolutiva e prevenção de recaída. Ao qual Judith Beck (2013) define essa etapa do processo terapêutico, como uma preparação para que os pacientes consigam lidar de forma autônoma com suas demandas, através de rever o que foi aprendido em terapia, desde traçar estratégias para combater a remissão de sintomas e preparar o paciente caso retorno para algo que já foi trabalhado.
De modo geral foi percebido uma melhora em seu processo de enfrentamento de conflitos, com posicionamento assertivo e ausência de insônia. Com o relato do paciente de conseguir responder a seus pensamentos automáticos de forma autônoma devido as técnicas aprendidas em sessão, como o teste de realidade e a respiração diafragmática.
Sobre a sua relação com os pais, convém maior aprofundamento, pois devido a natureza e complexidade da demanda, uma forte aliança terapêutica é necessária. O mesmo vale para questões de relacionamento, cujas demandas podem possuir forte ligação uma com a outra.
Discussão
Ao entender a construção do caso de Sr. J, a hipótese diagnóstica seria de que alguns modelos de práticas parentais adotados por seus pais, tiveram por consequência em sua vida adulta sentimentos de abandono, dificuldade em reconhecer emoções, assim como necessidades pessoais e necessidades de aprovação. Essas questões podem refletir na sua cognição no sentido de um certo medo de julgamento, dificuldade na elaboração da tomada de decisões importantes, esquiva de pessoas importantes dentro de um relacionamento como forma de defesa, onde as relações ocorrem com seu pensamento já voltado ao desfecho. O mesmo pode se perceber também com o trabalho, visto que sua média de permanência entre um emprego e outro seria de 8 meses, um tempo relativamente curto, o que pode indicar instabilidade em ambos os aspectos.
Os esquemas disfuncionais de rejeição e abandono, os quais correspondem ao domínio de limites prejudicados, atrelados a sua dificuldade em lidar com conflitos, podem estar relacionados a um conjunto de comportamentos de repressão emocional, onde o paciente acaba não estabelecendo limites ou se posicionando, gerando assim um prejuízo na comunicação assertiva. Em conjunto a isto foi analisado dificuldades em reconhecer as próprias necessidades e comportamentos de esquiva ao lidar com situações que fogem de sua alçada, o que convém um olhar acerca das suas habilidades sociais as quais podem ser trabalhadas.
Contudo, devido a identificação destes esquemas disfuncionais terem origem através de seu processo de desenvolvimento, por meio de práticas parentais negativas vivenciadas, se faz necessária uma forte aliança terapêutica para o tratamento destas demandas, além de serem classificados como objetivos a longo prazo.
Sua ansiedade e insônia podem ter ligação com os eventos de 2018, ligados aos processos de luto, término de relacionamento, questões financeiras e a nova fase como cuidador de um parente, em que o paciente passou por diversas eventualidades, levando a exposição repentina ao estresse e que de modo prolongado podem contribuir para o surgimento de ansiedade, assim como outras repercussões psíquicas.
Resultado e conclusão
Com os resultados obtidos, conclui-se que a forte aliança terapêutica é um componente vital na Terapia Cognitiva Comportamental. A aderência do Sr. J. foi um fator essencial para seu tratamento, ainda mais se tratando da natureza de suas demandas, como por exemplo a relação com os pais, por corresponder aos vínculos primários de seu desenvolvimento. Ao final das 17 sessões foi possível observar que apesar de apresentar dificuldade de lidar com conflitos, o paciente aceitou bem as colocações do terapeuta, o que acarretou em ganho ao se posicionar perante o mercado de trabalho de uma maneira diferente.
Além do entendimento da origem de como cada sintoma surge no indivíduo, as técnicas comportamentais e cognitivas mostradas, tem como objetivo fazer o paciente pensar de maneira saudável, ajustando assim seus pensamentos automáticos e crenças disfuncionais. Embora ainda algumas questões estejam em aberto, necessitando de uma exploração mais aprofundada dos modelos de esquemas disfuncionais, nesse primeiro momento suas evoluções se deram no quadro de ansiedade, insônia e na gestão de conflitos. Tudo isso foi possível devido ao processo de reestruturação cognitiva, ocorrendo por meio da modificação de crenças e pensamentos disfuncionais, a adaptação de um modelo saudável e de maior ajuste ao mundo real.
Os resultados assim foram sua melhora no processo de autoconhecimento, diminuição nas cognições de imagem negativa voltada a si, ausência do quadro de insônia, desenvolvimento de estratégias saudáveis na busca de emprego e na gestão com o conflito no ambiente religioso e confiabilidade no terapeuta ao falar sobre assuntos que antes estavam reprimidos, como o abuso sofrido.
Algumas recomendações para o caso seriam de dar continuidade nas questões com a ansiedade, focando, principalmente, no presente; trabalhar seu autoconhecimento no sentido de olhar para si; aprofundar as questões pertinentes a sua relação com os pais, relacionamentos afetivos e a associação com o abandono.
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ABNT — WILVERT, A. P., IAKUSCH, V. Ansiedade, fatores de risco e práticas parentais: um caso de clínica escola. CadernoS de PsicologiaS, n. 4. Disponível em: https://cadernosdepsicologias.crppr.org.br/ansiedade-fatores-de-risco-e-praticas-parentais-um-caso-de-clinica-escola/. Acesso em: __/__/___.
APA — Wilvert, A. P., Iakusch, V. Ansiedade, fatores de risco e práticas parentais: um caso de clínica escola. CadernoS de PsicologiaS, 4. Recuperado de: https://cadernosdepsicologias.crppr.org.br/ansiedade-fatores-de-risco-e-praticas-parentais-um-caso-de-clinica-escola/