Resumo: Defender a atenção integral em saúde significa considerar a discussão sobre violência, principalmente àquelas realizadas contra grupos mais vulneráveis, como são os casos de crianças e adolescentes. Este trabalho teve como objetivo argumentar as implicações do atendimento psicossocial e cuidado em saúde em contextos de violência na cidade de Foz do Iguaçu/PR a partir da análise dos dados de atendimento realizados entre 2020 e 2022 no CREAS I. Foram 1406 famílias atendidas nesse período, cerca de 2554 crianças e adolescentes, a negligência (27,9%) foi o tipo de violência mais registrada, em sua maioria praticadas pelos genitores, pessoas conhecidas e também pelo Estado, este último surge considerando as dificuldades de acessar o mercado de trabalho e políticas públicas (saúde, educação, habitação), compreende-se assim que o cuidado só pode ser consolidado pela atuação articulada de todos os atores da rede de proteção.
Palavras-chave: saúde; infância; saúde pública.
PSYCHOSOCIAL ATTENTION AND HEALTH CARE IN A FRONTIER REGION
Abstract: Defending comprehensive health care means considering the discussion about violence, especially those carried out against more vulnerable groups, such as children and adolescents. This work aimed to argue the implications of psychosocial care and health care in contexts of violence in the city of Foz do Iguaçu/PR based on the analysis of care data carried out between 2020 and 2022 at CREAS I. There were 1406 families assisted in this period, about 2554 children and adolescents, negligence (27.9%) was the most registered type of violence, mostly practiced by parents, known people and also the State, in the latter evaluating the difficulties of accessing the job market and public policies (health, education, housing), it is understood that care can only be consolidated through the coordinated action of all actors in the protection network.
Keywords: health; infancy; public health.
ATENCIÓN PSICOSOCIAL Y CUIDADO DE LA SALUD EN UNA REGIÓN FRONTERIZA
Resumen: Defender la atención integral de la salud significa considerar la discusión sobre las violencias, especialmente las ejercidas contra grupos más vulnerables, como los niños y adolescentes. Este trabajo tuvo como objetivo argumentar las implicaciones de la atención psicosocial y la atención a la salud en contextos de violencia en la ciudad de Foz do Iguaçu/PR a partir del análisis de los datos de atención realizados entre 2020 y 2022 en el CREAS I. Fueron 1406 familias atendidas en este período, alrededor de 2554 niños y adolescentes, la negligencia (27,9%) fue el tipo de violencia más registrado, practicada en su mayoría por los padres, personas conocidas y también por el Estado, evaluando en este último las dificultades de acceso al mercado laboral y a las políticas públicas (salud, educación, vivienda), entiende que el cuidado sólo puede consolidarse a través de la acción de todos los actores de la red de protección.
Palabras-clave: salud; infancia; salud pública.
Em 1996, a Assembleia Mundial de Saúde publicou a resolução nº WHA 49.25 na qual caracteriza a violência como um dos principais problemas de saúde pública em todo o mundo. No Brasil, de maneira particular, o Ministério da Saúde (MS) através da Portaria nº 737/2001 definiu-a como: “[…] ações realizadas por indivíduos, grupos, classes, nações que ocasionam danos físicos, emocionais e espirituais a si próprios e aos outros” (BRASIL, 2001, p.4). Ambos os documentos apresentam a violência e sua relação direta com o estado de saúde e de bem-estar das pessoas envolvidas e incluem principalmente aquelas praticadas contra a população mais vulnerabilizadas, sejam mulheres, pessoas racializadas, crianças, adolescentes e/ou pessoas com deficiência.
No que diz respeito à criança e ao adolescente, em 20 de novembro de 1989 a Convenção sobre os Direitos da Criança (CDC) foi adotada pela Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) e traçou os princípios básicos para o tratamento da infância no mundo, entrando em vigor em 1990. No mesmo ano o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) foi instituído através da Lei nº 8.069/90, rompendo com as diretrizes do obsoleto Código de Menores e tomando como referencial doutrinário o princípio da proteção integral, reconhecendo crianças e adolescentes como sujeitos de direito, embasando-se no Art. nº 227 da Constituição Federal (CF), assegurando a proteção sem distinção de raça, cor ou classe social.
Neste sentido, alguns anos depois o Ministério da Saúde (MS), tornou obrigatório, para todas as instituições de saúde, em casos de suspeita ou de confirmação de maus tratos o preenchimento da Ficha de Notificação de Violência Interpessoal/Autoprovocada em duas vias: a primeira deveria estar sob a guarda da unidade notificadora, enquanto a outra deve ser encaminhada ao setor municipal responsável pela Vigilância Epidemiológica para registro no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) e consolidação dos dados. Obrigatoriamente deve também ser feito uma comunicação ao Conselho Tutelar e/ou às autoridades competentes.
A partir deste momento a violência passou, através da Portaria no 104/2011 e da Portaria nº 1271/2014, a constar na lista de doenças, agravos e eventos de notificação compulsória de importância para a saúde pública em toda a rede nacional de saúde, seja pública ou privada. Para Deslandes, Assis e Santos (2005, p. 44) a violência perpetrada contra crianças e adolescentes são “representada em toda ação ou omissão capaz de provocar lesões, danos e transtornos a seu desenvolvimento integral”. Dessa maneira, podemos levantar a hipótese de que as condições em que nascem e se desenvolvem podem impactar sobre sua condição de saúde (OPAS/OMS, 2018).
Pensando nisto, a Lei nº 13.431/2017 normatizou e organizou o Sistema de Garantias de Direitos das Crianças e Adolescentes (SGDCA) para vítimas e/ou testemunhas de violência, estabelecendo medidas de assistência e proteção, traçando diretrizes e fluxos para o atendimento, assim como a integração dos órgãos públicos governamentais e a sociedade civil na aplicação das leis e no cumprimento dos programas e políticas intersetoriais.
No Paraná, os números são alarmantes: entre os anos de 2012 e 2016 foram registrados 48.870 casos de violência contra crianças e adolescentes, com prevalência em meninas com idades entre 0 e 4 anos, de raça negra e indígena (AGUIAR, ROZIN e TONIN, 2019). Em consulta ao Painel de Dados da Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos, o Disque Direitos Humanos – Disque 100, canal para denúncias de violações de grupos vulneráveis, entre os meses de janeiro a abril de 2023 registrou 2.680 casos de violência na faixa etária de 0 a 19 anos, correspondendo a mais de vinte por dia.
Considerando a magnitude do fenômeno da violência e seu impacto, principalmente sobre os serviços do Sistema Único de Saúde (SUS), este trabalho teve por objetivo geral analisar os dados dos de atendimento realizados entre os anos de 2020, 2021 e 2022 do Centro de Referência Especializado de Assistência Social I (CREAS I), equipamento da Proteção Social do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) em Foz do Iguaçu/PR, e pretende discutir as implicações no atendimento psicossocial e cuidado em saúde às crianças, adolescentes e suas famílias em contextos de violência numa cidade de fronteira na América Latina, assim como subsidiar o desenvolvimento de ações de intervenção pela rede de proteção visando o enfrentamento das violências e à garantia dos direitos.
Metodologia
Na direção do debate proposto acima, o presente artigo é resultado de um estudo epidemiológico descritivo, de base documental, realizado na cidade de Foz do Iguaçu/PR, no qual foram utilizados dados secundários, cuja fonte primária foram informações dos atendimentos e/ou acompanhamentos no CREAS, equipamento do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), a escolha por este local se deu em razão deste espaço ser um espaço privilegiado para compreensão do contexto da violência na região de fronteira sob a perspectiva do cuidado em saúde.
Ainda do ponto de vista metodológico, é importante salientar que a coleta de dados o qual subsidiou a análise e debate contidos neste texto foi realizada em acervo documental do referido equipamento público chamado de “Caracterização”, disponível em acervo digital de domínio pertencente à Prefeitura Municipal de Foz do Iguaçu/PR.
O acesso a estes documentos foi possibilitado mediante emissão de termo de autorização da Secretaria Municipal de Assistência Social, após estabelecimento de compromissos éticos com a pesquisa a garantia do anonimato e sigilo. Por se tratar de dados secundários, ou seja, já coletados e sem identificação das vítimas, foram classificados em planilhas de texto, com posterior análise minuciosa, descrição e apresentação dos resultados.
A Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais publicada em 2009 organiza por níveis de complexidade os serviços da Assistência Social. O CREAS integra a Proteção Social Especial (PSE) e articula-se com os demais serviços socioassistenciais, nas diversas políticas públicas e com os demais órgãos do Sistema de Garantia de Direitos. Realiza o atendimento e/ou acompanhamento de indivíduos e famílias de forma integral e intersetorial que, em determinado momento, vivenciaram situação de risco pessoal ou social, por violação de direitos em decorrência de diferentes tipos de violência, tem por objetivo a promoção de direitos, preservação e fortalecimento de vínculos familiares, comunitários e sociais e o fortalecimento da função protetiva das famílias (BRASIL, 2009).
Importante ressaltar que o município de Foz do Iguaçu atualmente dispõe de duas unidades de CREAS e os dados aqui apresentados são do registro de uma destas; além disto, cabe destacar que estes apenas se referem aos grupos familiares em acompanhamento e por isso não inclui informações de famílias que receberam atendimento pontual.
Resultados e Discussão
Foz do Iguaçu está localizada na região Oeste do estado do Paraná, faz parte da conhecida Tríplice Fronteira latino-americana, isto é, trata-se de uma cidade que tem outros dois países se avizinhando dos seus limites territoriais.
Ao Sul está a cidade argentina de Puerto Iguazú e a oeste a cidade paraguaia de Ciudad del Este. De acordo com Kleinschmitt, Azevedo e Cardin (2014) e Silva (2020) o Brasil tem nove tríplices fronteiras, mas considerando a densidade populacional a qual inclui também as populações das cidades na faixa [1] de fronteira, esta é a mais importante da América do Sul. Estima-se que em 2014 havia aproximadamente 800 mil habitantes que circulavam pelo município, essa característica configura uma metrópole regional e impacta em diversos aspectos, em especial à saúde.
Por esta razão, nas discussões sobre a violência na contemporaneidade impõe considerar as dinâmicas da fronteira que (re)configuram os modos de viver, criam dispositivos de exclusão (DA SILVA, 2021) e marcam o cotidiano da população da região. De acordo com as informações da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) o município contava em 2021 com 257.971 habitantes, em um território de 414,58km² [2], 89.855 com idades entre zero e dezenove anos. Sabendo que a atenção integral é um dos princípios do SUS o MS estabeleceu em 2010 o atendimento através da “Linha de Cuidado para a Atenção Integral à Saúde de Crianças, Adolescentes e Suas Famílias em Situação de Violência”, traçando diretrizes para os serviços e profissionais, organizadas em eixos estratégicos.
Desde 2016 o município de Foz do Iguaçu conta com um “Protocolo de Atendimento à Criança e Adolescente Vítima de Violência” o qual estabelece os fluxos e encaminhamentos necessários para o acolhimento e atendimento destes na Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), conforme instituído pelo Ministério da Saúde, na Portaria MS/GM nº 3.088/2011. Outra informação importante, a se somar neste movimento de contextualização, é a que Foz do Iguaçu/PR tem trinta e três Unidades Básicas de Saúde, um Centro de Atenção Psicossocial Infanto-Juvenil e uma Unidade de Acolhimento Infanto-Juvenil.
Nos últimos anos, foram atendidas no CREAS I um total de 1406 famílias entre 2020 e 2022, sendo, 527 famílias em 2020, 490 em 2021 e 389 famílias em 2022. Foram 2554 crianças e adolescentes atendidas, sendo 1559 crianças (0-12) e 995 adolescentes (13-18), algumas famílias tinham mais de uma pessoa com idade menor de dezoito anos em sua composição que também se encontravam com os direitos violados. Apresentamos a Tabela 1, com os tipos de violência identificada e dividida por faixa etária.
Fonte: Autores, 2023.
Deste modo, foram registrados mais de um tipo de violência por criança/adolescente, consistindo um total de 2831, conforme demonstrado na última coluna, em sua grande maioria, praticada contra menores de 12 anos, conforme segunda, quarta e sexta coluna. Na primeira linha observa-se que o tipo mais registrado foi negligência, perfazendo um total de 27,9% dos casos, segundo Azevedo (2005) diferente das demais, que são representadas pela ação, esta é pela omissão de garantir a proteção integral, como o descaso com a higiene, ausência de acompanhamento, descuido com a segurança, demora na procura de atendimento em saúde diante de sinais de doença são alguns exemplos (BRASIL, 2010).
Mas, esta é uma linha muito tênue, para Minayo (2006, p. 92) “[…] a reconhecida ausência de condições econômicas de famílias em situação de pobreza e miséria dificulta um julgamento mais preciso entre a prática abusiva e a impossibilidade de prover os requisitos para seu crescimento e desenvolvimento”. Dito de outro modo, a condição socioeconômica é um fator de risco para a negligência, e não a causa, portanto, cabe principalmente ao Estado, o papel de nortear políticas públicas, para a promoção da saúde e garantia dos direitos (LIMA ET. AL., 2021).
Conforme a segunda linha da tabela, cerca de 15% foram vítimas de violência sexual, principalmente na faixa etária de 13-18 anos de idade. Nestes casos, além da notificação ao Conselho Tutelar e seguimento de cuidado na rede é obrigatório que os serviços de saúde independente do sexo da vítima, realizem os testes para Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST) e em adolescentes do sexo feminino é indispensável à contracepção emergencial (BRASIL, 2010).
Logo abaixo, percebemos que a violência física, com 12,8% dos registros, foi a quarta tipologia mais identificada. Embora assegurado o direito da criança e do adolescente de serem educados e cuidados sem o uso de castigos físicos ou de tratamento cruel ou degradante através da Lei 13.010/2014. Os agravos desse tipo de violência podem em alguns casos: “[…] apresentar mutilações e fraturas, lesões oculares e auditivas, […] levando à invalidez temporária ou permanente e até a morte” (MINAYO, 2006, p. 88-89).
Neste sentido, é importante que o profissional da equipe, responsável pelo acolhimento, realize uma avaliação de risco e solicite se necessário o afastamento do convívio familiar de forma emergencial aos órgãos de proteção seja Vara da Infância e da Juventude, Ministério Público ou Delegacia Especializada (BRASIL, 2010), conforme exposto na sexta linha da tabela, esse afastamento foi recomendado para 7,5% das famílias atendidas.
Nos casos de crianças e adolescentes em situação de rua e extrema pobreza, assim como em situação de trabalho infantil, identificou-se na oitava e nona linha o aumento gradual com o passar dos anos analisados. Neste ponto é preciso considerar que, em Foz do Iguaçu/PR existe o fenômeno do trabalho infantil desempenhado pelas crianças indígenas, Reimann (2013) explica que diariamente existe a migração de crianças e adolescentes paraguaios que cruzam a Ponte da Amizade, saindo de Ciudad del Este para venda de artesanatos, balas, doces e que se colocam por vezes em situação de mendicância em território brasileiro. Segundo Minayo (2006), é preciso ainda considerar o aliciamento para o tráfico de substâncias psicoativas e para a exploração sexual, originando-se na vulnerabilidade socioeconômica do núcleo familiar.
O CREAS I está localizado na região central do município e realiza o atendimento em todos os territórios, foram registradas as maiores incidências de violências no território norte durante os três anos consecutivos, seguido pelo leste e nordeste. No que tange ao sexo biológico, sem surpresa a maioria significativa foram meninas (0-12), conforme já identificado pelo Ministério da Saúde (BRASIL, 2010) e pela UNICEF (2021). Na adolescência houve a prevalência de duas violências contra adolescentes do sexo feminino para cada adolescente do sexo masculino (2:1) na mesma faixa etária.
Os dados coletados que serviram de base para este artigo apontaram também que aproximadamente 6% das crianças e adolescentes tinham algum tipo de deficiência, no ano de 2021 foi de uma criança para cada trinta (1:30) e em 2022 um adolescente para cada doze (1:12). Não havia o registro de qual diagnóstico, mas a literatura traz que se trata de “deficiência mental e/ou com distúrbios de comportamento, que moram com seus pais, familiares ou estão institucionalizadas” (BRASIL, 2001, p. 9).
Este mesmo documento indicou que os genitores (pai e mãe) prevalecem como supostos autores de violência e, portanto, um número elevado de violências ocorre em ambientes intrafamiliares, essas informações vão ao encontro dos dados trazidos pela UNICEF (2021) e por Azevedo (2005). Apesar disso, para Xavier (2016) o tipo de violência muda conforme a função parental, as mães são atribuídas àquelas em que são omissas aos cuidados ou que utilizam de recursos punitivos, como a negligência e a violência física, enquanto aos pais prevalecem as violências sexuais.
Além das situações de violência, algumas vulnerabilidades foram identificadas, como a gravidez na adolescência, demandas de saúde mental na composição familiar e abuso de substância psicoativa, tanto pela criança/adolescente atendido quanto por seu responsável. A pesquisa trouxe também dados sobre quantas mulheres também se encontravam em situação de violência, sendo uma para cada seis (1:6) em 2021 e uma para cada quatro (1:4) em 2022.
Tais aspectos nos leva a considerar o Estado como um autor de violência, pois os profissionais registraram as dificuldades da família em acessar algumas políticas públicas, como a inserção no mercado de trabalho. De acordo com Santos, Jacinto e Tejada (2012) a relação causal entre renda e saúde pode ser observada sob dois vieses do que nomearam de “armadilha saúde-pobreza”, isto é, a hipossuficiência financeira causa impactos na saúde (por exemplo, falta de acesso à alimentação adequada) e esses impactos refletem na condição de saúde e bem-estar (por exemplo, quadros de desnutrição), além de diminuir a taxa de produtividade e por consequência a oferta de trabalho.
Assim como a política de educação, embora seja um direito previsto no Art. 205 da CF (1988) e no Art. 53 do ECA (1990), surgiu também a ausência de habitação. Neste sentindo Santos, Jacinto e Tejada (2012, p.233) nos lembram que pessoas mais vulnerabilizadas moram em “lugares com condições precárias de saneamento básico e que sejam mais vulneráveis a doenças, principalmente as crianças”.
No que tange à saúde, uma em cada quatro (1:4) famílias relatou que não conseguiu o atendimento no SUS em 2020, em 2021 foi uma para cada cinco (1:5) e em 2022, houve o um aumento de mais de 20%, sendo uma para cada duas (1:2). Neste aspecto cabe relembrar que o recorte temporal apresentado se refere aos anos mais intensos da pandemia pelo COVID-19, por conta disto, no Brasil, diversos instrumentos normativos foram editados pelo Governo Federal para regular a questão da Saúde na região de fronteira (SILVA, 2023) e do funcionamento dos equipamentos públicos diante da necessidade de reorientar os protocolos de atendimento e a forma de prestação de serviços, principalmente no âmbito da saúde.
Considerações Finais
A violência contra crianças e adolescentes é uma triste realidade em diversas partes do mundo, e infelizmente, em Foz do Iguaçu, não é uma exceção. A cidade, conhecida pelas suas belezas naturais e pelo turismo, também enfrenta desafios significativos no que diz respeito a esta temática. Ao final desta discussão, dois pontos merecem especial atenção e desenvolvimento de novas pesquisa, o primeiro deles foi o aumento no registro de crianças e adolescente com algum tipo de deficiência, que são frequentemente mais vulneráveis à violência devido a uma série de fatores, incluindo discriminação, estigmatização e falta de proteção adequada.
Outro aspecto foi o trabalho infantil realizado por crianças indígenas na fronteira, há de se lembrar que este grupo é igualmente vulnerável devido à falta de políticas e programas específicos para protegê-las, e apesar da necessidade de ser abordado com sensibilidade cultural, respeitando as tradições e crenças das comunidades. É também preciso garantir que todas as crianças, independentemente de seus marcadores raciais ou étnicos, tenham seus direitos protegidos.
Para combater a violência contra crianças e adolescentes é fundamental uma abordagem intersetorial, envolvendo autoridades locais, organizações da sociedade civil, representantes das comunidades indígenas e outros atores socais relevantes. É necessário ainda investir em políticas públicas eficazes de proteção à infância, programas de educação e conscientização, assim como promover o respeito aos direitos das crianças, incluindo o direito de não serem exploradas por qualquer tipo de violência.
De todo modo, é importante ampliar a discussão das violências para além das tipificadas e considerar, por exemplo, a violência estrutural, conforme proposta por Minayo (2006) que servem de base para a maioria das violências, pois reúnem aspectos da desigualdade social e da discriminação que se expressa de múltiplas formas, como a falta de acesso a moradia e ao saneamento básico, que podem resultar na proliferação de doenças, quadros de desnutrição e mortes na primeira infância.
Sugere-se a ampliação do debate aqui proposto de forma que avalie também os aspectos culturais, étnico-raciais e de gênero das famílias, considerando que Foz do Iguaçu/PR é um município fronteiriço com um significativo fluxo e circulação de migrantes.
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[1] A faixa de até cento e cinquenta quilômetros de largura, ao longo das fronteiras terrestres, conforme estabelecido pela Constituição do Brasil de 1988 (Capítulo II, art. 20, alínea XI, § 2º).
[2] Não foi possível trazer informações quanto ao tipo de violência por gênero, pois não havia o registro desta informação no documento que serviu de base para este artigo.
ABNT — SILVA, A. F., VICENTINI, M. Atenção Psicossocial e Cuidado em Saúde em Região de Fronteira. CadernoS de PsicologiaS, n. 5, 2023. Disponível em: https://cadernosdepsicologias.crppr.org.br/atencao-psicossocial-e-cuidado-em-saude-em-regiao-de-fronteira/. Acesso em: __/__/_____
APA — SILVA, A. F., VICENTINI, M. Atenção Psicossocial e Cuidado em Saúde em Região de Fronteira. CadernoS de PsicologiaS, 5. Recuperado de: https://cadernosdepsicologias.crppr.org.br/atencao-psicossocial-e-cuidado-em-saude-em-regiao-de-fronteira/