Revista CadernoS de PsicologiaS

Ciência, Política e a Responsabilidade: reflexões a partir de Oppenheimer

Augusto Ferreira de Moraes
Titulação acadêmica: acadêmico do 8º período do curso de Psicologia

Centro de Ensino Superior dos Campos Gerais (CESCAGE) — E-mail: augusto.afdm3@gmail.com

#Resenha

NOLAN, C. (Produtor), THOMAS, E. (Produtor), ROVEN, C (Produtor), & NOLAN, C (Diretor). (2023). Oppenheimer [analógico]. Universal City, Califórnia: Universal Studios.

Algumas semanas após o lançamento do filme Oppenheimer nos cinemas, e com a chuva de marketing – que foi até mesmo intensificado pelo filme da Barbie, que diga-se de passagem são lados totalmente opostos –, decidi ir assisti-lo. Durante as mais de três horas de filme me senti como aquele garoto do oitavo ano do ensino fundamental, apaixonado pela história da Segunda Guerra Mundial. Confesso que, na época, embora estudasse a respeito, nunca me interessei de fato para pesquisar ou questionar mais a fundo a razão pela qual as bombas atômicas foram construídas. A única coisa que eu tinha certeza era das barbáries ocorridas nesse momento crítico da história. 

Hoje, com os olhos de um futuro psicólogo com ênfase em psicologia social e comunitária, percebo a responsabilidade que nós, enquanto profissionais e cientistas temos para com a sociedade e o planeta. Digo, não devemos usar do jargão “fazer ciência” para afastar-nos da responsabilidade social e política de nossas inovações e estudos, como se isso fosse algum passe para que pudéssemos fazer o que quiséssemos com a justificativa de estarmos estudando e testando – “fazendo ciência”. Portanto, esse texto tem o objetivo de fazer uma reflexão acerca disso, usando como assunto tema justamente o filme Oppenheimer para aprofundar mais as questões acerca da ciência, da política, da ética e da responsabilidade, para refletirmos: será que essas coisas são assuntos complementares ou não devem se misturar? 

Oppenheimer, dirigido por Christopher Nolan, é um dos filmes mais aguardados de 2023 pelos amantes de história, e sobretudo, de ciência. Conta a história do físico teórico americano, Oppenheimer, nascido em 1904, tendo como maior referência em seu nome a criação da bomba atômica no Projeto Manhattan, que tinha como objetivo a pesquisa e o desenvolvimento das primeiras bombas atômicas dos Estados Unidos, as quais foram responsáveis pelo bombardeamento nas cidades de Hiroshima e Nagasaki em 1945, no Japão.  

Ademais, sabe-se que essas bombas foram planejadas e projetadas com o investimento dos Estados Unidos e apoio do Reino Unido e Canadá, o que só foi possível com o conhecimento teórico e técnico de diversos cientistas, sendo o mais lembrado, o próprio Oppenheimer.  

Para alguns filósofos do iluminismo no século XVIII, muitos diriam que não deveria haver qualquer restrição sobre o “fazer ciência”, sem ao menos pensar a respeito dos impactos, tais quais foram nas duas cidades japonesas. Em perspectiva com uma filosofia mais atual como a do século XX, com os conhecimentos a partir da Teoria Crítica, defende-se que haja alguma regulação na ciência, dentro dos parâmetros éticos. 

O Projeto Manhatan começa em 1942, a partir de uma carta endereçada a Roosevelt, escrita pelo físico nuclear Leó Szilárd e assinada por Albert Einstein, visto sua relevância acadêmica e política. Nela era denunciada a Alemanha Nazista e explicada a possibilidade de uma possível cadeia de reações nucleares em uma grande massa de urânio, resultando em um poder explosivo extremamente poderoso. Com o desenvolvimento do projeto, cria-se a cidade de Los Alamos, onde ficava o laboratório de estudo e experimentos acerca de bombas nucleares. Além disso, o projeto contou com apoio da Universidade de Chicago, da Universidade de Berkeley, inúmeros grupos de cientistas e diversas empresas privadas. Estima-se que o Projeto Manhatan tenha empregado mais de 100 mil pessoas, elas sabendo ou não dos impactos que esse projeto poderia causar. 

Após o Teste Trinity, em julho de 1945, onde a bomba The Gadget foi atirada de uma torre de 30 metros de altura na cidade de Alamogordo e sendo um sucesso, têm-se em sequência a criação das bombas Little Boy e Fat Man, as quais seriam lançadas, respectivamente, na cidade de Hiroshima, em 6 de agosto de 1945, e em Nagasaki, em 9 de agosto do mesmo ano. Ambas as cidades foram literalmente escolhidas durante uma reunião, por poderem ser cidades divulgadas como alvos militares. Vale ressaltar que nessa altura da guerra, a Alemanha já havia se rendido após a morte de Hitler, portanto, estava prestes a acabar. 

Posterior a isso, há diversos questionamentos da população mundial acerca desse ato, inclusive, são realizadas investigações nos Estados Unidos sobre o Projeto Manhatan. Ao passo que Oppenheimer e outros cientistas são questionados sobre os danos causados, eles se posicionam como tecnocratas, não atuantes de questões militares e políticas. Portanto, há duas hipóteses que podem ser trabalhadas, de que eles não sabiam o que estavam construindo, ou então, de que sabiam, mas não possuíam clareza política do que estava acontecendo no cenário global da guerra. 

No pós-guerra, começam reflexões acerca da regulamentação atômica, até mesmo criação de agências atômicas nas quais cientistas estavam engajados. Além disso, há também uma reflexão acerca da responsabilidade da ciência no que diz respeito às suas criações e o papel dos cientistas enquanto profissionais em exercício de suas profissões e atuantes dentro de uma sociedade. 

Portanto, os cientistas devem estar empenhados nas reflexões acerca dos impactos que essa ciência pode causar na vida humana. Caso contrário, volta-se ao conceito do iluminismo, muito presente durante a criação das bombas nucleares, de que todo conhecimento é bom e válido, até o momento em que isso seja responsável pela morte de milhares de pessoas.

Ademais, devemos ter uma responsabilidade social, e não apenas moral, estando assim dentro dos critérios éticos e políticos de um dever enquanto cientistas. Isso é, têm-se a necessidade de uma responsabilidade frente ao coletivo, sabendo de nossos direitos e deveres frente à sociedade enquanto um cidadão e pesquisador. Portanto, há um papel para além do produzir conhecimento, mas também um papel social, do qual devemos sim ser apreciados e, se for o caso, responsabilizados, visto que nossas pesquisas e inovações têm impactos na vida de inúmeras pessoas, e até na nossa.

Além disso, devemos fazer da nossa profissão uma atividade também política, e isso não significa levantar uma bandeira partidária, mas sim de possuir uma responsabilidade social frente ao coletivo. Entretanto, há de se expor que esse posicionamento apenas do cientista não se faz transformador, há também a responsabilidade do Estado e de outros órgãos que auxiliam na pesquisa e na divulgação da ciência. 

Enquanto futuros psicólogos, devemos ocupar-nos desses lugares, de crítica, como bem fundamenta diversas cartilhas do CFP a respeito da atuação em políticas públicas. Isso é, possuir, dentro de um processo de problematização da atuação profissional e do fazer ciência, um olhar que dê norte a uma compreensão crítica a respeito da sociedade, do mundo, das políticas, dos contextos sócio-históricos e dos fenômenos sociais. E além disso, se pôr em própria reflexão acerca das teorias e práticas do fazer do psicólogo. Ao possuir essas críticas sobre sua própria atuação e promover enquanto profissional uma justiça social e reflexão sobre a sociedade, poderá ser possível deslumbrar uma sociedade que faça ciência pensando na responsabilidade social. 

Como citar esse texto

ABNT — MORAES, A. F. Ciência, Política e a Responsabilidade: reflexões a partir de Oppenheimer. CadernoS de PsicologiaS, n. 4. Disponível em: https://cadernosdepsicologias.crppr.org.br/ciencia-politica-e-a-responsabilidade-reflexoes-a-partir-de-oppenheimer/Acesso em: __/__/___.

APA — Moraes, A. F. (2023). Ciência, Política e a Responsabilidade: reflexões a partir de Oppenheimer. CadernoS de PsicologiaS, 4. Recuperado de: https://cadernosdepsicologias.crppr.org.br/ciencia-politica-e-a-responsabilidade-reflexoes-a-partir-de-oppenheimer/