Resumo: O processo de inserção da mulher no mercado de trabalho, deu-se de forma árdua e carregada de lutas e privações vindas de uma sociedade machista e patriarcal. Partindo disso, foram demarcados o problema de pesquisa e seus respectivos objetivos geral e específico. O problema de pesquisa ficou delimitado: Quais as influências sociais, históricas e culturais construídas, perante a reprodução da violência contra a mulher no ambiente de trabalho? Desta maneira, propõe-se abordar a forma como o papel social da mulher é construído culturalmente, analisar sua entrada no mercado profissional, e compreender a violência vivenciada por estas, neste ambiente. Para tal teve-se como base teórica a Psicologia Histórico-Cultural a qual se embasa no método do Materialismo Histórico Dialético.
Palavras-chave: Violência; trabalho; história.
WOMEN: VIOLENCE IN THE LABOR MARKET, ANALYSIS BY HISTORICAL-CULTURAL PSYCHOLOGY
Abstract: The process of insertion of women in the labor market took place in an arduous way and loaded with struggles and deprivations coming from a sexist and patriarchal society. Based on this, the research problem and its respective general and specific objectives were demarcated. The research problem was delimited: What are the social, historical and cultural influences constructed in the face of the reproduction of violence against women in the workplace? In this way, it is proposed to address the way in which the social role of women is culturally constructed, to analyze their entry into the professional market, and to understand the violence experienced by them in this environment. For this, the theoretical basis was Historical-Cultural Psychology, which is based on the method of Dialectical Historical Materialism.
Keywords: Violence; work; history.
MUJERES: VIOLENCIA EN EL MERCADO LABORAL, ANÁLISIS DESDE LA PSICOLOGÍA HISTÓRICO-CULTURAL
Resumen: El proceso de inserción de la mujer en el mercado laboral se dio de manera ardua y cargada de luchas y privaciones provenientes de una sociedad machista y patriarcal. A partir de ello, se delimitó el problema de investigación y sus respectivos objetivos generales y específicos. Se delimitó el problema de investigación: ¿Cuáles son las influencias sociales, históricas y culturales construidas frente a la reproducción de la violencia contra las mujeres en el ámbito laboral? De esta manera, se propone abordar la forma en que se construye culturalmente el rol social de las mujeres, analizar su ingreso al mercado profesional y comprender la violencia que viven en este entorno. Para ello, la base teórica fue la Psicología Histórico-Cultural, que se basa en el método del Materialismo Histórico Dialéctico.
Palabras-clave: Violencia; trabajar; historia.
Introdução
A violência contra a mulher está presente na sociedade desde a antiguidade, sendo uma questão histórica e cultural, bem como não é limitada à esfera doméstica e estendendo-se ao mundo produtivo e capitalista, onde enfrentam reproduções machistas e patriarcais. Devido a isso, a presente pesquisa tem como objetivo compreender histórica e culturalmente o papel social da mulher e a construção de violência contra a mulher no âmbito profissional, com fins de entender a trajetória e concepção de atuação e inserção das mulheres neste meio, assim como realizar uma análise da violência contra ela (Feitosa; Lima, 2018).
Ainda, com a ascensão do capitalismo e a necessidade de mão-de-obra produtiva, as mulheres, antes dedicadas aos cuidados da casa e da família, são inseridas em um processo gradual e de muita luta, no mercado de trabalho, majoritariamente ocupados por homens, onde sofrem questões de violência psicológica, sexual, moral, patrimonial, além de um processo de hierarquização e inferiorização constante, não deixando de lado as tarefas domésticas e a responsabilidade pelos cuidados com a família, assumindo duplas jornadas de trabalho, sendo perceptível a influência do aspecto econômico na regulamentação de gênero e também das relações entre homem e mulher (Toitio, 2008).
Desta forma, as discussões de revisão de literatura e pesquisa bibliográfica propostas neste trabalho, possuem como base teórica a Psicologia Histórico-Cultural embasado no método, o Materialismo Histórico-Dialético, proposto pelo filósofo alemão Karl Marx (1818-1883), o qual propõe a existência dos homens por meio do trabalho e a transformação da natureza, é através da mediação pelo trabalho, que constroem materialmente a sociedade e se constroem então, como indivíduos (Lessa; Tonet, 2004). Lev Semenovich Vygotsky (1896–1934), psicólogo, foi pioneiro no conceito de que o desenvolvimento intelectual do homem ocorre em função das interações sociais e condições de vida. Vygotsky buscava construir uma nova psicologia, que integrasse o homem abrangendo suas questões sociais, suas relações entre si e a capacidade de transformação de tais relações, como uma Psicologia Geral, que comportasse os conhecimentos teóricos já existentes e elevasse-os diante da necessidade de compreender o homem e suas relações com o meio que o período exigia (Tuleski, 2008).
A partir de uma visão de mundo na qual o homem só pode ser realmente compreendido nas relações que são estabelecidas com o meio e com os outros homens, Vygotsky desenvolve uma Psicologia histórica que leva em conta o indivíduo e a sua interação com a sociedade, nos seus aspectos sociais, históricos e culturais (Biffi, 2008, p. 48).
Se faz uma perspectiva histórica por considerar a relação de constante processo de mudança que o mundo e o homem estão e, para ele, a definição do social e do cultural acontecem através da compreensão e constituição da história e do homem (Pino, 2000).
São pelos papéis sociais que se organizam uma estrutura social, são leis e normas, que cristalizam o comportamento de um indivíduo dentro de uma determinada organização, são eles responsáveis por uma socialização do homem, constituindo uma identidade individual e coletiva (Martins, 2010). A situação social de um indivíduo ou papel social imposto a ele, é resultado de uma imposição atribuída pela sociedade, que é artificializada de acordo com os papéis e funções determinados pelo padrão do grupo social em que o indivíduo está inserido, conforme o autor:
Os papéis sociais são representações sociais, como se a sociedade fosse um grande teatro, onde a maioria dos personagens não consegue se voltar para dentro de si mesmos e fazer uma distinção entre quem são e os papéis que desempenham. Dentro do cenário montado pela sociedade hierarquizada se adaptam e justificam a discriminação social (Martins, 2010, p. 44).
Sabe-se que a sociedade tem por padrão institucionalizar o papel do homem e da mulher em seu discurso social. Essa divisão é muitas vezes interpretada a partir das diferenças biológicas, de tal forma que ambos os gêneros detêm poder: o masculino uma autonomia de atuação pública e o feminino privado, mais voltado às funções maternais e reprodutoras. Esses espaços são compreendidos como construções históricas, e as formas de um agente social levam uma pessoa a pensar, sentir ou agir de um modo, que nem sempre partiria espontaneamente dela (Caixeta; Barbato, 2004).
Nogueira (2017), retrata que o olhar para com a mulher vem carregado de privações, obrigações, silêncios e omissões. Postulando-a neste lugar de vulnerabilidade, havendo a influência direta em sua complexidade e identidade social e pessoal, no sentido de obrigações elencadas socialmente para o papel de ser mulher, entre ser mãe, dona de casa, e esposa, relacionando que essas funções cabem somente as mulheres, não havendo uma distinção correlata entre gênero e sexo de masculino e feminino, de construção cultural ou biológica, como dito pela autora Butler:
[..] evidencia que ao contrário do que se imagina, gênero não obtém relação direta com o conceito de sexo, o gênero faz referência a uma construção cultural não biológica, enquanto sexo corresponde ao parâmetro de biológico (Butler apud 1Nogueira, 2017, p. 04).
Conforme descrito por Nogueira (2017), essa separação de tarefas, obrigações e a imposição de uma vulnerabilidade, entre homens e mulheres, é justificado por meio de características biológicas que diferenciam os seres humanos, o sexo biológico, aquele com o qual cada individuo nasce. Segundo Jaqueline Gomes de Jesus (2012, p.28), o sistema binário de gênero advém de uma “crença, construída ao longo da história da humanidade, em uma dualidade simples e fixa entre indivíduos dos ”sexos” (gêneros) feminino e masculino.” Igualmente, Saffioti (2011), o define como “a construção social do masculino e do feminino” (Saffioti, 2011, p. 45), ou seja, ele parte da história e da cultura. Partindo deste conceito, para os homens e mulheres: “A eles corresponde uma certa divisão social do trabalho, conhecida como divisão sexual do trabalho, na medida em que ela se faz obedecendo ao critério de sexo.” (Saffioti, 2011, p. 58), desta forma, pode-se observar como as questões de sexo e gênero, influenciam na divisão das atividades, responsabilidades e direitos.
A desigualdade, longe de ser natural, é posta pela tradição cultural, pelas estruturas de poder, pelos agentes envolvidos na trama de relações sociais. Nas relações entre homens e entre mulheres, a desigualdade de gênero não é dada, mas pode ser construída, e o é, com frequência (Saffioti, 2011, p. 71).
Para Caixeta e Barbato (2004), apesar das diversas mudanças sociais ocorridas historicamente, que levaram as mulheres a adentrar mais no espaço público com maior força e frequência, não se consegue alterar significativamente o conceito de identidade feminina construído ao longo da história. A mulher continua constituindo-se em múltiplas facetas, mas sua principal fonte de identificação ainda é a maternidade e de cuidadora do lar.
Para compreendermos o papel social da mulher, precisamos entender a transformação que começou a acontecer no século XVIII na sociedade, em virtude das mudanças políticas, sociais e econômicas, como o início da industrialização e a formação da sociedade capitalista. Assim, a existência da família burguesa surge no lugar da família feudal, sendo construída a ideia de família nuclear tradicional de pai provedor, mãe que cuida da casa e da família e as crianças aparecendo como o membro que precisa de maiores cuidados para seu desenvolvimento, a mulher é confinada na esfera doméstica, onde passa a viver com objetivo de cuidar da casa (Caixeta; Barbato, 2004).
Dessa forma, institucionaliza-se então, a identidade para a mulher, o papel de dona de casa não é entendido como um trabalho, e sim, como uma obrigação. Esse discurso começa a se modificar no século XX, as mulheres passaram então, progressivamente, a ocupar o mundo do trabalho, assumindo um papel social de profissional, que não modificou seus papéis sociais, mas o ampliou. Segundo Sousa, Guedes (2016, p. 123), “as atribuições socialmente definidas para homens e mulheres, no fim das contas, permanecem nas concepções culturais, uma vez que delegam ainda às mulheres as responsabilidades da reprodução social”.
A era primitiva nos proporcionou uma concepção inicial de divisão de tarefas baseado em uma premissa de imagem de gênero2, uma vez que os homens se destinavam à caça e atribuíam o dever de cuidar à mulher. Diante desse contexto, se instaurou ao papel feminino os afazeres domésticos, esses valores cristalizados impossibilitaram por muito tempo a inserção da mulher no ambiente de trabalho, limitando sua atuação, não reconhecendo a atuação doméstica como um trabalho, por não atribuir uma relação econômica. Neste sentido, apenas na Idade Moderna que as atribuições destinadas às mulheres se expandiu e reconheceu sua condição enquanto trabalhadora digna de reconhecimento assalariado, legitimando seu trabalho frente a uma visibilidade que não existia diante da sociedade permitindo a inserção da mulher dentro das indústrias (Torres, 2006). O mercado de trabalho, durante a segunda metade do século XX, sofreu profundas transformações, na qual destaca-se a entrada da mulher no mesmo. Porém, apesar de sua grande importância, ainda apresenta desigualdades tão relevantes quanto, sua mão de obra é apropriada de forma perversa, com menor salário, carga horária estendida, acúmulo de tarefas, haja visto além do emprego ainda existem as tarefas domésticas incumbidas como responsabilidade da mulher, e isso tudo se dá, devido às divisões sociais e sexuais entre homens e mulheres (Silva, 2015).
Em um antigo manuscrito, escrito em 1846, por Marx e Engels (1980, p. 70-71), nota-se que: “[…] o primeiro antagonismo de classes que apareceu na história coincide com o desenvolvimento do antagonismo entre homens e mulheres na monogamia: e a primeira opressão de classes, com a opressão do sexo feminino pelo sexo masculino”. Esses podem ser considerados como os primórdios da divisão sexual do trabalho no capitalismo, fomentando destarte o não-reconhecimento das potencialidades das mulheres ao mesmo nível dos homens. De maneira geral, é possível afirmar que as conjunturas variáveis da economia capitalista comandam a participação ativa das mulheres na sociedade econômica, uma vez que sua formação social econômica configura-se com a necessidade de construir uma ampla barreira para mascarar as injustiças sociais presentes em uma sociedade competitiva.
A inclusão parcial das mulheres no mercado de trabalho está intimamente relacionada com a insuficiência de mecanismos de conciliação entre trabalho e família. Essa atribuição de afazeres domésticos do papel social da mulher, está intrinsecamente ligado à manutenção e reprodução do sistema capitalista, uma vez que as mulheres ficam responsáveis pela prole, o que na ausência dessas atribuições por parte delas, o Estado seria responsável por fazer toda a manutenção que garante a reprodução de mão de obra do trabalhador, o que seria uma grande demanda visto a massa de proletariado e a diminuição do lucro em cima dos trabalhadores (Cisne, 2015). Neste contexto, Saffioti (1973) afirma também que com os dados dos últimos 40 anos, detém-se ampla tendência à estabilização da presença feminina no conjunto de mão de obra efetivamente empregada no país. Porém, a mulher brasileira continua a sofrer discriminação salarial (exceto em cargos públicos, onde há padronização de salários), bem como a ser isoladas do desempenho de certas funções de mando e daquelas que exigem força.
Nesse sentido, é notório uma divisão sexual do trabalho, onde essa divisão articula uma hierarquização, onde o exercício da função masculina sobressai e portanto subalterniza a ocupação considerada naturalmente feminina, produzindo uma divisão de gênero dentro do ambiente de trabalho, conferindo as mulheres um baixo prestígio social e se concretizando diante disso, um espaço de violência (Cisne, 2015).
A busca íntegra pela igualdade de gênero na relação capital e trabalho reconhece que a entrada da mulher no mercado de trabalho, trouxe incômodo quanto às relações de poder entre os sexos, o que implicou na contravenção de padrões sociais e culturais que concediam apenas ao homem a participação de relações sociopolíticas. O estranhamento da companhia feminina no ambiente de trabalho, é manifestado não somente por relações de poder, mas também por conta de condutas ilícitas pautadas por uma conotação sexual. Dessa forma o assédio sexual aparece, em várias ocasiões, expressando uma violência de gênero estrategicamente empregado para que as mulheres cedam diante dos instrumentos de força utilizados (Higa, 2016). Dentre tantos formatos de violação, está a violência especificamente contra a mulher, que historicamente, e apoiado na desigualdade e hierarquização entre homens e mulheres, são mais atingidas e contudo, vinculado a alguns tipos de formatos dessas violências, sendo a violência física, psicológica, sexual, patrimonial e moral (Brasil, 2006).
A Lei Maria da Penha foi sancionada em 7 de agosto de 2006 com o intuito de proibir, e prevenir a violência contra mulher, apesar de ter sido validada somente em 2006, a luta contra a violência é antiga e se mantém até os dias atuais. Tendo como assistência inicial o tratado internacional em 1979 pelas Nações Unidas, promulgando a Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de Discriminação da Mulher, que tem como intuito promover o direito das mulheres na busca de direitos igualitários entre homens e mulheres além de reprimir qualquer forma de discriminação contra a mulher, é uma carta magna importantissíma para o direito das mulheres e representa o ínicio de avanços normativos e político que foram construídos durante o tempo, promovendo conformidade em todos âmbitos, seja eles políticos, econômicos, sociais ou culturais e eliminar todas as distinções.
[…] Para os fins da presente Convenção, a expressão “discriminação contra a mulher” significará toda a distinção, exclusão ou restrição baseada no sexo e que tenha por objeto ou resultado prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício pela mulher, independentemente de seu estado civil, com base na igualdade do homem e da mulher, dos direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural e civil ou em qualquer outro campo (Convenção Sobre A Eliminação De Todas As Formas De Discriminação Contra A Mulher, 1979).
Se tratando de uma herança cultural o fato de tratar e enxergar as mulheres como objeto ou submissa a figura masculina, é significativo apontar que ao passo que a sociedade não possuir consciência e não dissipar tais práticas, e continuar passando para as futuras gerações esses atos, somente Leis e ações governamentais serão insuficientes para romper com este problema, dado que não se trata de algo somente constitucional, relativo ao cidadão, mas sim de um evento social e cultural (Leite; Noronha, 2015). Atualmente dentro do contexto organizacional, as mulheres enfrentam dificuldades para além de sua inserção profissional no mercado de trabalho, o assédio moral é concreto e segundo Silva, Bittar (2012, p. 01) “as vítimas de assédio moral podem ser mulheres e homens, mas as pesquisas realizadas no Brasil e em outros países mostram que o fenômeno ocorre com maior frequência entre as mulheres, sendo estas o grupo mais vulnerável”. Esse tipo de assédio é comum e recorrente dentro de algumas organizações, e é uma ação desfavorável que interfere na dignidade humana, na segurança do trabalhador, em sua autoestima e seu conforto no ambiente de trabalho, produzindo um adoecimento psíquico e desmotivação de suas atividades, e as mulheres estão mais propensas a esse tipo de violação, consequência de toda construção histórica de seu papel ser inferior ao do homem, diante de um ideal de não serem capacitadas o suficiente para ocupar postos de trabalho de alta complexidade e responsabilidade (Silva; Bittar, 2012).
Essa conquista da inserção feminina no mercado de trabalho, ou “intrusão”, pelo viés do machismo que não aprova a mesma posição hierarquizada entre homens e mulheres, difunde um ambiente hostil, ofensivo e adverso para as mulheres. Segundo Kay, West apud Higa (2016), os números são alarmantes e evidenciam a violação de assédio sexual contra as mulheres em seu ambiente de trabalho: “no que tange à incidência em relação ao gênero: a) homens assediando mulheres – 90%; b) homens assediando homens – 9%; c) mulheres assediando homens – 1%”. Diante dessa discrepância não é possível ignorar o quanto o fator gênero em específico o feminino está sujeito ao assédio.
Com esta pesquisa, pode-se observar que o processo de inserção da mulher no mercado de trabalho, foi um processo difícil. Pode-se perceber que o papel de mãe, esposa e dona de casa, foi fortemente defendido durante anos, objetificando a mulher como se essas fossem suas únicas capacidades, e ainda, inferiorizando-as quando comparadas aos homens tendo uma imagem propagada de “sexo frágil” essa construção perpassa gerações, colocando as mulheres em um patamar excludente ao de capacidades para além do âmbito familiar e doméstico.
Com muita luta e insistência, o mercado de trabalho abre as portas para o gênero feminino, mas não porque de fato compreenderam que a mulher possui competências de atuação, e sim por uma necessidade de mão de obra barata, fundamental para produção e manutenção das indústrias e do sistema capitalista. No entanto, ao se inserir no mercado de trabalho e construir seu espaço, por meio de lutas, as mulheres enfrentam desafios constantes convivendo com uma cultura machista e misógina dentro das organizações, a mulher se encontra em um cenário onde seu trabalho não é valorizado, é inferiorizado pelos homens que se colocam acima e reforçam uma divisão sexual e de gênero do trabalho, é notável que essa divisão já se concretiza como uma violência.
Além disso, a violência contra a mulher é um processo fossilizado na cultura e na história, que relaciona-se com a dinâmica sexista do capitalismo aliado a mão-de-obra e de inferiorização da mulher, diante de todos os fatos apontados no decorrer dessa pesquisa, cabe questionar o motivo da perpetuação dessa sociedade machista, patriarcal e capitalista que é injusta e hostil com o gênero feminino. Qual a explicação, se não, a manutenção de um sistema que evidencia uma estratificação social, luta de classes, e a desigualdade social, reproduzindo uma desigualdade de gênero, que não ocorre de forma inesperada, mas parte de um processo intencional, para além daquilo que é identificável, limitando os espaços das mulheres para que não estejam ativas sócio e politicamente, indicando menos confronto com esse sistema. É possível notar a necessidade de uma essência feminina, um papel social de mulher que contribua com os interesses do capital, pois ao transferir a responsabilidade de cuidados domésticos não remunerados às mulheres, aos cuidados dos filhos, estas realizam atribuições indispensáveis para o funcionamento do sistema capitalista.
Sem essas funções desempenhadas pelas mulheres, o Estado precisaria arcar com toda responsabilidade que assegura ao trabalhador, seu tempo e dedicação a produção do capital, tudo aquilo que garante a reprodução da força de trabalho, como escola em tempo integral em grande escala para os filhos. No entanto, existiria uma grande demanda para ser suprida, assim transmitindo essas atribuições e cuidados para o gênero feminino, que exerce sem remuneração, uma dupla jornada de trabalho dentro e fora de casa, a partir dessa construção do papel social de mulher, contribuindo duplamente para o desenvolvimento do capitalismo sem ao menos ter valorização e condições acessíveis de trabalho, apenas posições inferiores e subalternas ao homem.
A violência de gênero é uma questão complexa que gera impactos profundos na saúde mental das vítimas. Os processos de sofrimento mental decorrentes dessa violência podem incluir: traumas psicológicos, depressão e ansiedade, pois o medo constante e a insegurança podem levar a quadros depressivos e de ansiedade, afetando a qualidade de vida e as relações interpessoais, baixa autoestima, isolamento social, uma vez que a vergonha e o estigma podem fazer com que as vítimas se afastem de amigos e familiares, intensificando a solidão e a sensação de desamparo, e tirando-as de uma rede de apoio, dificuldades de relacionamento.
A psicologia tem um papel fundamental na promoção de mudanças nos estigmas associados à violência de gênero e no apoio às vítimas. A psicologia pode trabalhar para educar a sociedade sobre a violência de gênero, desafiando normas culturais e estigmas que perpetuam essa violência. Já a terapia deve ser um espaço seguro para as vítimas, oferecendo suporte emocional e ajudando na reconstrução da autoestima e da identidade, e manter-se em uma formação continuada, haja visto ser crucial que os profissionais de psicologia se mantenham atualizados sobre as questões de gênero, incorporando uma perspectiva crítica em sua prática clínica. A abordagem psicológica deve ser integral, levando em consideração os aspectos sociais, culturais e individuais que cercam a violência de gênero. Promover um ambiente de compreensão e apoio pode ajudar as vítimas a se recuperarem e a combaterem os estigmas que ainda persistem na sociedade.
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