Revista CadernoS de PsicologiaS

Ofício nº3388-21

Curitiba, 26 de novembro de 2021
Ofício elaborado para posicionamento sobre Indicação 4692 (Vereador Santão) - Lei "Anti Vadiagem".
À Câmara Municipal de Londrina-PR

#Cadernos_Técnicos_do_CRP-PR

O CONSELHO REGIONAL DE PSICOLOGIA DO PARANÁ (CRP-PR), autarquia federal com função de orientação, fiscalização e disciplina do exercício profissional de Psicólogas(os) do Paraná, atuando em conformidade à Lei Federal 5.766/1971, vem, por meio desta carta, manifestar REPÚDIO à Indicação 4692 de autoria do Vereador Santão, da Câmara Municipal de Londrina-PR em 11 de novembro deste ano. 

A iniciativa “sugere ao Prefeito do Município a criação da Lei Anti Vadiagem”, tornando-se proibido qualquer ocupação, destinação de recursos e auxílios para “os indivíduos que se negam à disponibilidade de ajuda por parte do município através das Casas de Apoio/Afins”. O indicativo foi lamentavelmente aprovado por maioria da Câmara Municipal de Londrina. 

Neste sentido, este Conselho se manifesta com relação à sugestão de Lei “Anti Vadiagem”, baseado nos seguintes Princípios Fundamentais do Código de Ética do Profissional Psicólogo:

I. O psicólogo baseará o seu trabalho no respeito e na promoção da liberdade, da dignidade, da igualdade e da integridade do ser humano, apoiado nos valores que embasam a Declaração Universal dos Direitos Humanos. 

II. O psicólogo trabalhará visando promover a saúde e a qualidade de vida das pessoas e das coletividades e contribuirá para a eliminação de quaisquer formas de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão

Entendemos que o Poder Público deve atuar de forma a promover direitos, conforme preconiza a Constituição Cidadã de 1988 e entendemos que a luta por ampliação das políticas públicas faz parte do compromisso da Psicologia brasileira em atuar em direção ao fortalecimento dos processos de democratização do país e a promoção dos direitos sociais à todas e todos. 

A terminologia desta redação legislativa faz opção por termos que remetem à “Lei da Vadiagem”, uma contravenção prevista em Decreto de 1941, durante a Ditadura do Estado Novo. O aparato legal era repressivo e criminalizava pessoas que não tinham como subsistir e encontravam-se em situação de vulnerabilidade. Esta postura do Estado tem raízes históricas ligadas à escravidão e está relacionada a uma ideia higienista, prática diretamente ligada a um saber eugenista. Compreendemos que projetos nesta esteira respondem a uma lógica da necropolítica, baseado em interesses capitalistas, em detrimento da vida, pois justificam a ação pela perda de valor de mercado das propriedades no entorno dos locais de permanência desta população. Tal ação se constitui em uma prática de higienização social, grave violação dos direitos humanos. 

Toda(o) e qualquer cidadã(o) brasileira(o) tem o direito constitucional de ir, vir e permanecer, em consonância com a nossa lei magna, a Constituição Federal. A Indicação 4692 criminaliza determinado segmento social, quando lhe retira este direito. Outra grave violação de direitos, sugerido na iniciativa legislativa, consiste na retirada compulsória dos pertences deste grupo social, como colchões, cobertores, roupas etc. Isso significa retirar as mínimas condições de dignidade à estas pessoas, o que não pode ser tolerado. 

A Psicologia Brasileira tem compromisso histórico com a promoção de direitos sociais e humanos para todas e todos, compreendendo que esta ética deve mobilizar o exercício profissional em todas as suas dimensões. Fazemos a defesa intransigente dos Sistemas Únicos de Saúde (SUS) e de Assistência Social (SUAS) porque entendemos que as Políticas Públicas podem promover minoração das desigualdades sociais que, estruturadas pelo neoliberalismo e o capitalismo, atravessam a sociedade. 

Cumpre-nos portanto lembrar, por dever de ofício, da existência de arcabouços legais que amparam as políticas para atendimento à população em situação de rua. Em primeiro momento, ressaltamos o Decreto 7053 da Presidência da República, de 23 de dezembro de 2009, que institui a Política Nacional para a Pessoa em Situação de Rua e seu Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento. Assim, até onde alcançamos o debate entre as alçadas dos legislativos municipais, estaduais e federal, ainda somos regidos pelo princípio federativo, tornando este Decreto da Presidência a guia e sentinela para discussões locais. 

Ressaltamos que entre os princípios da Política Nacional para a População em Situação de Rua, além de igualdade e equidade, o inciso segundo fala do direito à convivência familiar e comunitária. Tal preceito pode aqui ser entendido para o quanto “arrancar” as pessoas de seus territórios e núcleos de convívio, ainda que nômades, ou submetê-las a anacrônicos modelos de testagens de substâncias psicoativas, fere o direito à convivência comunitária. Ainda se ampliarmos a noção da família para além do recorte tradicional, estruturado e nuclear, de acordo com as concepções mais lúcidas e contemporâneas de família ampliada, podemos ter elementos para inferir que a partilha de afetos, convívios e rotas fazem de muitas(os) parceiras(os) dos chamados “trecheiros” a função de equivalente familiar. 

Destacamos que, entre as diretrizes da Política Nacional para a População em Situação de Rua, encontra-se no inciso X do artigo 6º a recomendação de “democratização do acesso e fruição dos espaços e serviços públicos”. Democratizar o acesso significa não só garantir que a população em situação de rua possa, entre exemplos, escolher qual unidade de atenção primária à saúde se sente mais acolhido, como inclui democratizar o próprio fluxo, o próprio “estar na rua” como um espaço de cuidado, desde que possa ser acessado por Políticas Públicas executadas de forma intersetorial, tais como as que ocorrem com as equipes volantes da Rede Socioassistencial, ou pelas ações correlatas à Saúde por meio das estratégias de redução de danos ou tecnologias como equipes dos Consultório de Rua, entre outras tantas ações — algumas delas destacadas “ipsis letteris” na Política Nacional para Pessoas em Situação de Rua — que desenvolvemos enquanto sociedade para não reduzirmos nossas ações aos paradigmas vis de exclusão social e gentrificação, comuns aos tempos de neoliberalismo atento à especulação imobiliária, mas também comuns aos paradigmas do nazismo com seus campos de concentração ou, para ficarmos em uma analogia mais corriqueira, comuns aos serviços de “carrocinha” das secretarias de zoonoses. 

Enquanto sociedade, superamos essas barbáries, continuaremos a superá-las e, todas as vezes que se mostrar necessário, lutaremos como tantos lutaram para dizer isso — enquanto ainda podemos dizer e enquanto vicejar o espaço democrático e plural de defesa de ideias.

Também destacamos a importância, dentro os objetivos da Política Nacional em Situação de Rua, de, tal qual consta no inciso V, “desenvolver ações educativas permanentes que contribuam para a formação de cultura de respeito, ética e solidariedade entre a população em situação de rua e os demais grupos sociais, de modo a resguardar a observância aos direitos humanos”, o que exige por parte tanto do Executivo quanto do Legislativo Municipal a criação de estratégias para que o preconceito e o higienismo não sejam tolerados em Londrina, em qualquer parte da Federação e, quiçá, do planeta. 

Essas ações de conscientização superam campanhas informativas, pois exigem um trabalho que se infiltre no cotidiano das(os) munícipes, para compreensão integral e estrutural dos múltiplos fenômenos que ensejam a questão da população em situação de rua. E, nesse sentido, parece-nos que a Câmara Municipal de Londrina mais se presta a um desserviço do que contribui para esse objetivo exposto

Além disso, é de fundamental importância considerar o caráter punitivo da medida que penaliza o indivíduo pelo exercício de sua autonomia, lembrando que não cabe ao Estado gerir sobre a liberdade individual dos corpos. Cabe sim, a garantia a dignidade e autonomia de todo e qualquer cidadão. Ressaltamos, portanto, os preceitos estabelecidos na Resolução 40 do Conselho Nacional de Direitos Humanos, de outubro de 2020: 

Art. 2º As ações de promoção, proteção e defesa dos direitos humanos das pessoas em situação de rua devem se guiar pelos princípios da Política Nacional para a População em situação de Rua, conforme o Decreto nº 7.053/2009, quais sejam: 

I – Respeito à dignidade da pessoa humana;

II – Direito à convivência familiar e comunitária;

III – Valorização e respeito à vida e à cidadania;

IV – Atendimento humanizado e universalizado; e

V – Respeito às condições sociais e diferenças de origem, raça, idade, nacionalidade, gênero, orientação sexual e religiosa, com atenção especial às pessoas com deficiência.

A Indicação 4692 (Vereador Santão) desta forma vai de encontro com o Art. 4º da Resolução CNDH 40/2020 que prevê que “Os entes federados devem desenvolver estratégias e condições para assegurar o acesso da população em situação de rua às políticas sociais destinadas ao conjunto da população”. A iniciativa legislativa aprovada pela Câmara Municipal de Londrina realiza o oposto: desenvolve impedimento de acesso aos equipamentos públicos voltados justamente para esta população socialmente vulnerável, o que contradiz com o que vem sendo estabelecido com relação as tecnologias críticas de atenção e cuidado para a população em situação de rua não só no Brasil, mas no mundo. 

Consideramos fundamental o alinhamento dos serviços ofertados com o que é preconizado pela Resolução CNDH 40/2020, na perspectiva do respeito à dignidade da população em situação de rua no exercício de sua autonomia e o acesso aos serviços públicos de direito. Destacamos os seguintes artigos: 

Art. 109 – Os entes federados devem assegurar o atendimento às demandas relacionadas à saúde da população em situação de rua, garantindo:

I – Estabelecimento de fluxo específico com a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), Consultório de Rua e com as Unidades de Acolhimento Transitório da Saúde para o atendimento de pessoas em situação de rua, inclusive crianças e adolescentes, com sofrimento psíquico e\ou uso abusivo de álcool e outras drogas, evitando institucionalizações que violem direitos;

Art. 110 – Os entes federados devem fortalecer e ampliar as ações de promoção à saúde, pelas equipes e programas da Atenção Primária à Saúde, com ênfase na estratégia Saúde da Família, incluindo prevenção, detecção precoce e tratamento de doenças com alta incidência na população em situação de rua, como infecções sexualmente transmissíveis – ISTs –, tuberculose, hanseníase, hipertensão arterial, diabetes, desnutrição infantil e entre pessoas idosas, anemias e outras deficiências nutricionais, doenças respiratórias, problemas dermatológicos, transtornos mentais, prevenção à violência, necessidades decorrentes do uso abusivo de álcool e outras drogas, entre outras.

Além disso, destacamos também a Resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) sobre a “Política nacional judicial de atenção a pessoas em situação de rua e suas interseccionalidades”, nos seus artigos:

Art. 1º – II – Considerar a heterogeneidade da população em situação de rua, notadamente quanto ao nível de escolaridade, naturalidade, nacionalidade, identidade de gênero, características culturais, étnicas, raciais, geracionais e religiosas, e com atenção aos aspectos interseccionais no atendimento a essa população, pensando em mulheres, população LGBTQIA+, crianças e adolescentes, pessoas idosas, pessoas convalescentes, população negra, pessoas egressas do sistema prisional, migrantes, povos indígenas e outras populações tradicionais, pessoas com deficiência, com especial atenção às pessoas em sofrimento mental, incluindo aquelas que fazem uso abusivo de álcool e outras drogas, exigindo tratamento equitativo e políticas afirmativas, para assegurar o gozo ou exercício dos direitos, nos termos do art. 5 da Convenção Interamericana contra Toda Forma de Discriminação e Intolerância;

Art. 3º – A Política de que trata esta Resolução será orientada pelos seguintes princípios: I – Respeito à dignidade da pessoa humana;

II – Não criminalização das pessoas em situação de rua;

III – promoção do acesso aos direitos de cidadania e às políticas públicas;

IV – Respeito à autonomia das pessoas em situação de rua ou com trajetória de rua e seu reconhecimento como sujeitos de direito, a quem deve ser assegurada sua participação nos processos decisórios sobre sua própria vida e questões coletivas a elas pertinentes;

VI – Compreensão da pessoa em situação de rua como sujeito integral, a partir do reconhecimento como um sujeito de direitos com dimensões integrais, tais como aspectos psíquicos, físicos e sociais, como componentes indissociáveis e interdependentes;

IX – Atuação voltada à redução de riscos e danos físicos e sociais, com vedação das práticas repressivas e de diagnóstico, prescrição, indicação ou determinação forçada de tratamentos terapêuticos, manicomiais ou religiosos para pessoas em situação de rua ou que façam uso abusivo de álcool e outras drogas.

X – Atuação comprometida contra toda forma de violência contra as pessoas em situação de rua, com destaque para a violência institucional, por meio da adoção todas as diligências e medidas cabíveis para prevenção, apuração e responsabilização nesses casos;

XI – trabalho colaborativo e em rede entre atores institucionais envolvidos com a política, para alinhamento de protocolos e fluxos de trabalho, com visão holística e empática acerca da complexidade da pessoa em situação de rua, a fim de permitir uma abordagem multidimensional;

XII – não estigmatização e uso de linguagem que não reforce preconceitos e visões higienistas em relação à população em situação de rua.

Assim sendo, recomendamos que as(os) servidoras(es) e Excelentíssimas(os) Vereadores da casa também possam, tal qual demais servidoras(es) e prestadoras(es) de serviço do munícipio, serem respaldadas(os) por estratégias de formação continuada, fóruns intersetoriais e demais ações que permitam-lhes a reflexão crítica sobre a temática, de acordo com o estabelecido no inciso IX do artigo 6º das diretrizes nacionais para a população em situação de rua: “IX – implantação e ampliação das ações educativas destinadas à superação do preconceito, e de capacitação dos servidores públicos para melhoria da qualidade e respeito no atendimento deste grupo populacional”. 

Ressaltamos ainda que o Sistema Conselhos de Psicologia, por meio da Rede CREPOP/Conselho Federal de Psicologia, tramita a produção das Referências Técnicas para atuação de psicólogas(os) com pessoas em situação de rua. Tal documento deverá ser aberto à consulta pública e, depois disso, ter seu lançamento ratificado no ano de 2022 e, certamente, poderá contribuir com os debates junto à categoria e à sociedade, seja na nobre casa do povo de Londrina, predicado que cabe à Câmara Municipal de Londrina, seja em outros fóruns análogos. 

Por fim, em reconhecimento da lamentável aprovação desta iniciativa legislativa, cabe a este Conselho Regional de Psicologia do Paraná (CRP-PR) recomendações à Prefeitura Municipal de Londrina pela rejeição – e não apenas, mas o completo repúdio – à Indicação 4692 de autoria do Vereador Santão.

Além disso, o CRP-PR recomenda enfaticamente ao Poder Executivo Municipal a adoção imediata das recomendações que seguem

1 – Aplicação dos dispositivos do já mencionado Decreto nº 7.053/2009 – POLÍTICA NACIONAL PARA A POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA, integrando as políticas públicas de conjunto – de saúde, educação, assistência social, trabalho, habitação, segurança pública etc – nos princípios, diretrizes e objetivos da Política Nacional.

1.1 São princípios da Política Nacional para a População em Situação de Rua, além da igualdade e equidade:

I – Respeito à dignidade da pessoa humana;

II – Direito à convivência familiar e comunitária;

III – Valorização e respeito à vida e à cidadania;

IV – Atendimento humanizado e universalizado; e

V – Respeito às condições sociais e diferenças de origem, raça, idade, nacionalidade, gênero, orientação sexual e religiosa, com atenção especial às pessoas com deficiência.

 

1.2 São diretrizes da Política Nacional para a População em Situação de Rua:

I – Promoção dos direitos civis, políticos, econômicos, sociais, culturais e ambientais; II – Responsabilidade do poder público pela sua elaboração e financiamento;

III – Articulação das políticas públicas federais, estaduais, municipais e do Distrito Federal; IV – Integração das políticas públicas em cada nível de governo;

V – Integração dos esforços do poder público e da sociedade civil para sua execução; VI – Participação da sociedade civil, por meio de entidades, fóruns e organizações da população em situação de rua, na elaboração, acompanhamento e monitoramento das políticas públicas;

VII – Incentivo e apoio à organização da população em situação de rua e à sua participação nas diversas instâncias de formulação, controle social, monitoramento e avaliação das políticas públicas;

VIII – Respeito às singularidades de cada território e ao aproveitamento das potencialidades e recursos locais e regionais na elaboração, desenvolvimento, acompanhamento e monitoramento das políticas públicas;

IX – Implantação e ampliação das ações educativas destinadas à superação do preconceito, e de capacitação dos servidores públicos para melhoria da qualidade e respeito no atendimento deste grupo populacional; e

X – Democratização do acesso e fruição dos espaços e serviços públicos.

 

1.3 São objetivos da Política Nacional para a População em Situação de Rua:

I – Assegurar o acesso amplo, simplificado e seguro aos serviços e programas que integram as políticas públicas de saúde, educação, previdência, assistência social, moradia, segurança, cultura, esporte, lazer, trabalho e renda;

II – Garantir a formação e capacitação permanente de profissionais e gestores para atuação no desenvolvimento de políticas públicas intersetoriais, transversais e intergovernamentais direcionadas às pessoas em situação de rua;

IV – Produzir, sistematizar e disseminar dados e indicadores sociais, econômicos e culturais sobre a rede existente de cobertura de serviços públicos à população em situação de rua;

V – Desenvolver ações educativas permanentes que contribuam para a formação de cultura de respeito, ética e solidariedade entre a população em situação de rua e os demais grupos sociais, de modo a resguardar a observância aos direitos humanos;

VI – Incentivar a pesquisa, produção e divulgação de conhecimentos sobre a população em situação de rua, contemplando a diversidade humana em toda a sua amplitude étnico-racial, sexual, de gênero e geracional, nas diversas áreas do conhecimento;

VII – Implantar centros de defesa dos direitos humanos para a população em situação de rua;

VIII – Incentivar a criação, divulgação e disponibilização de canais de comunicação para o recebimento de denúncias de violência contra a população em situação de rua, bem como de sugestões para o aperfeiçoamento e melhoria das políticas públicas voltadas para este segmento;

IX – Proporcionar o acesso das pessoas em situação de rua aos benefícios previdenciários e assistenciais e aos programas de transferência de renda, na forma da legislação específica;

X – Criar meios de articulação entre o Sistema Único de Assistência Social e o Sistema Único de Saúde para qualificar a oferta de serviços;

XI – Adotar padrão básico de qualidade, segurança e conforto na estruturação e reestruturação dos serviços de acolhimento temporários, de acordo com o disposto no art. 8º

XII – Implementar centros de referência especializados para atendimento da população em situação de rua, no âmbito da proteção social especial do Sistema Único de Assistência Social;

XIII – Implementar ações de segurança alimentar e nutricional suficientes para proporcionar acesso permanente à alimentação pela população em situação de rua à alimentação, com qualidade; e

XIV – Disponibilizar programas de qualificação profissional para as pessoas em situação de rua, com o objetivo de propiciar o seu acesso ao mercado de trabalho.

2 – Ativação das atividades do COMITÊ INTERSETORIAL DE ACOMPANHAMENTO E MONITORAMENTO DA POLÍTICA NACIONAL PARA A POPULAÇÃO EM SITUAÇÃO DE RUA (CIAMP-RUA) em Londrina-PR: 
O CIAMP-Rua Londrina deve ser ativado no município, bem como ter funcionamento orgânico, para potencializar o monitoramento e proposição de políticas públicas para pessoas em situação de rua deste município. 

Retomamos que o Comitê tem, por atribuição:

I – Elaborar planos de ação periódicos com o detalhamento das estratégias de implementação da Política Nacional para a População em Situação de Rua;

II – Acompanhar e monitorar o desenvolvimento da Política Nacional para a População em Situação de Rua;

III – Desenvolver, em conjunto com os órgãos competentes, indicadores para o monitoramento e avaliação das ações da Política Nacional para a População em Situação de Rua;

IV – Propor medidas que assegurem a articulação intersetorial das políticas públicas para o atendimento da população em situação de rua;

V – Propor formas e mecanismos para a divulgação da Política Nacional para a População em Situação de Rua;

VI – Catalogar informações sobre a implementação da Política Nacional da População em Situação de Rua no município;

VII – Organizar, periodicamente, encontros para avaliar e formular ações para a consolidação da Política Nacional para a População em Situação de Rua, junto às organizações e entidades da sociedade civil.

Vale destacar a importância do CIAMP-Rua como instrumento de estruturação para as ações da Prefeitura de Londrina-PR frente ao contexto de complexidade e de violação integral e sistêmica de direitos que marcam a experiência da situação de rua. É importante ter em mente que a situação de rua pode durar dias ou anos, expondo crianças, adolescentes, homens, mulheres, pessoas idosas, pessoas com deficiência, às mais variadas violências. Isto enseja a construção de políticas públicas consistentes e efetivas. 

O contexto da situação de rua exige de Londrina-PR uma resposta urgente, pois trata-se de fenômeno diverso, de amplo alcance e que afeta diferentes grupos de pessoas de diferentes maneiras, mas com características comuns que estão contidas na definição de população em situação de rua trazida no já mencionado Decreto nº 7.053/2009. Com a instalação ou reativação do CIAMP-Rua, vários temas que dizem  respeito às políticas para a população em situação de rua e à implementação da PNPSR poderão ter lugar.

É fundamental fazer avançar, em Londrina-PR:

1.1 A articulação com gestores estaduais e de municípios vizinhos para a institucionalização de parcerias; 

1.2 A construção de diálogos com os órgãos do Governo do Paraná e Governo Federal para qualificar as ações existentes para essa população;

1.3 A criação de novo modelo de política com a centralidade no acesso imediato da pessoa em situação de rua a uma moradia, juntamente com um pacote de políticas setoriais que ajudem a pessoa a permanecer na sua moradia e que recebeu o nome de MORADIA PRIMEIRO, baseado no modelo Housing First 

1.4 Ações de diálogo com o Poder Legislativo, no acompanhamento dos Projetos de Lei e as várias legislações que dizem respeito ao tema, bem como o diálogo com parlamentares para compreensão das condições da população em situação de rua na perspectiva dos Direitos Humanos, fomentando a liberação de Emendas Parlamentares; o acompanhamento dos projetos financiados via Emendas Parlamentares de forma a garantir o uso do recurso público e o impacto positivo das políticas públicas no território; 

1.5 Ações voltadas para a garantia ao Registro Civil de nascimento e documentação básica para essa população, além de integração no Cadastro Único do Sistema Único de Assistência Social; 

1.6 Ações de redução de danos para uso problemático de drogas e/ou outras substâncias psicoativas, com tecnologias de acolhimento e cuidado com estas pessoas. Modelo de atenção psicossocial pautado pela ética da autonomia e dos Direitos Humanos, não repressivo tampouco proibicionista e em articulação aos equipamentos da Rede de Atenção Psicossocial; 

1.7 Curso de Promoção dos Direitos da População em Situação de Rua, voltado principalmente para os servidores, técnicos da sociedade civil e voluntários que atuam diretamente com a população em situação de rua em Londrina, com especial destaque à Guarda Municipal e outras forças de segurança; 

1.8 Definição de fluxos de atendimento e redefinição das regras para acolhimento institucional de pessoas em situação de rua, em perspectiva dialógica e de promoção de dignidade e autonomia; 

1.9 Fortalecimento dos equipamentos CentroPop e Consultório de Rua, compreendendo que o SUS e o SUAS devem ser amparados com recursos financeiros, infraestruturais e de pessoal; 

1.10 Alinhamento da política municipal para a população em situação de rua com os as orientações da Resolução CNDH 40/2020.

3 – Garantia de PRIORIDADE NA VACINAÇÃO DE TERCEIRA DOSE (COVID-19) PARA PESSOAS EM SITUAÇÃO DE RUA e equipes de servidores em contato com esta população em Londrina-PR. 
Para pugnar a constituição de campanhas de incentivo à imediata vacinação (primeira e segunda dose, bem como dose de reforço) de pessoas em situação de rua em Londrina-PR, novamente levamos em consideração que a Política Nacional para População em Situação de Rua, no Decreto Federal nº 7.053/2009, considera “população em situação de rua o grupo populacional heterogêneo que possui em comum a pobreza extrema, os vínculos familiares interrompidos ou fragilizados e a inexistência de moradia convencional regular, e que utiliza os logradouros públicos e as áreas degradadas como espaço de moradia e de sustento, de forma temporária ou permanente, bem como as unidades de acolhimento para pernoite temporário ou como moradia provisória”. 

Para tanto, expõe-se que diante dos desafios que se apresentam pela pandemia da Covid-19 e suas mutações, e a dura realidade em alta vulnerabilidade a que estão expostas as pessoas em situação de rua e equipes de políticas públicas em contato com esse segmento, o CRP-PR defende a PRIORIZAÇÃO E ACELERAÇÃO DO ESQUEMA DE IMUNIZAÇÃO COMPLETO deste grupo nas políticas de contenção à disseminação da Covid-19 neste município. 

Com essa recomendação, ensejamos nossa expectativa de que tal iniciativa legislativa pauta-se no desconhecimento e na falta de oportunidade de uma crítica mais refinada sobre a complexidade da temática, do que na mesma má-fé higienista que justifica exclusões, extermínios, campos de concentração ou gentrificações correlatas. Desta forma, reafirmamos o compromisso da Psicologia paranaense com a promoção de Direitos Humanos e no enfrentamento à toda sorte de violências e desigualdades. 

Atenciosamente.