Resumo: A Assistência Social é um campo de atuação que vem acolhendo percentual significativo dos profissionais da psicologia nos últimos anos. Com sua regulamentação ainda relativamente recente a sua consolidação enquanto política pública enfrenta grandes desafios. Em meio à batalha de enfrentamento ao seu desmonte, Psicólogas e demais atores dessa política estão na linha de frente compondo as equipes dos serviços essenciais no atendimento à população frente à situação de emergência pela COVID-19. Neste contexto a reflexão sobre processos de trabalho da profissional de Psicologia e a ampliação do olhar para as diversas variáveis imbricadas nas questões sociais e situações de vulnerabilidade que podem se agravar se faz tão urgente quanto a criação de estratégias de enfrentamento à situação pandêmica.
Palavras-chave: Psicologia; Assistência Social; pandemia.
Psychology in Social Assistance: the (im) possibilities of action in pandemic times
Abstract: Social Assistance is a field of action that has been welcoming a significant percentage of psychology professionals in recent years. With its relatively recent regulation, its consolidation as a public policy still faces great challenges. In the midst of the battle to face its dismantling, Psychologists and other actors of this policy are at the forefront composing the teams of essential services in assisting the population in the face of the emergency situation by COVID-19. In this context, the reflection on the work processes of the psychology professional and the broadening of the look at the various variables involved in social issues and situations of vulnerability that can become worse is as urgent as the creation of strategies to face the pandemic situation.
Keywords: Psychology; Social Assistance; pandemic.
Psicología en Asistencia Social: las (im) posibilidades de acción en tiempos pandémicos
Resumen: La Asistencia Social es un campo de actuación que viene albergando un porcentaje significativo de profesionales de la psicología en los últimos años. Con su reglamentación relativamente reciente a su consolidación como política pública, aún enfrenta grandes desafíos. En medio de la batalla para enfrentar su desmantelamiento, Psicólogas y otros actores en esta política, están en la línea de frente componiendo los equipos de servicios esenciales para atender la población frente a la situación de emergencia por COVID-19. En este contexto, la reflexión sobre los procesos de trabajo de la profisional de Psicología y la expansión de la mirada a las diversas variables involucradas en los problemas sociales y situaciones de vulnerabilidad que pueden empeorar, se hace tan urgente la creación de estrategias para enfrentar la situación ante la pandemia.
Palabras clave: Psicología; Asistencia Social; Pandemia.
A Assistência Social é uma Política Pública batalhada pela sociedade brasileira e regulamentada pela Constituição Federal de 1988 no âmbito da Seguridade Social, assim como a Saúde e a Previdência Social. Está descrita como a política pública que visa garantir a proteção social aos cidadãos e oferta apoio a indivíduos e famílias no enfrentamento de situações de vulnerabilidade e de risco pessoal e social. Com a ascensão da situação de emergência pela COVID-19, a Portaria Federal nº 10.282 de 20 de março de 2020, afirmou a assistência social no rol dos serviços essenciais durante a pandemia, ou seja, entre aqueles considerados indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da população.
A Assistência Social se organiza como um sistema, segundo a Política Nacional de Assistência Social – PNAS (Brasil, 2004), ela se define a partir das seguranças: de sobrevivência, de acolhida e de convívio familiar. Ainda, têm-se como eixos estruturantes dessa política a matricialidade sociofamiliar, garantindo proteção das famílias considerando suas singularidades; a territorialização, que visa considerar as especificidades de cada território de atuação; ainda ela incentiva o controle social e a participação da sociedade civil; e possui normativas de financiamento, recursos humanos, monitoramento e avaliação bem estruturadas.
Com a criação dos Serviços Socioassistenciais[1] e a publicação da Norma Operacional Básica de Recursos Humanos (NOB-SUAS)[2] a Psicologia ganhou espaço para compor as equipes mínimas nos atendimentos à população, tornando-se profissional de referência e obrigatório nos equipamentos, desta forma abrindo-se um campo de trabalho que atualmente abarca grande percentual das profissionais Psicólogas em atuação. A contribuição da Psicologia nesta política pública se alia à premissa dos direitos humanos conforme orientações de nossa profissão, previstas no Código de Ética do Psicólogo, visando o fortalecimento deste Sistema e contribui para a ampliação do olhar sobre a despatologização das questões humanas, que são, de fato, consequência das desigualdades sociais.
Em Foz do Iguaçu, município do extremo oeste do Paraná e de fronteira trinacional, a Comissão de Psicologia na Assistência Social (CPAS) do Conselho Regional de Psicologia, formada por profissionais inseridas em todos os níveis de proteção e também gestão dos serviços, tem realizado debates em relação aos desafios e possibilidades da prática profissional, especialmente neste contexto de pandemia, considerando as especificidades da região e dos territórios.
O Sistema Único de Assistência Social (SUAS) que é relativamente uma política jovem é também um campo de grande incidência de atuação de psicólogas e, percebeu-se que na região extremo oeste do Paraná, estas profissionais também são maioria jovens, conforme pesquisa realizada pela Comissão Psicologia e Assistência Social de Foz do Iguaçu – CRP 08, sobre “O Perfil do Profissional de Psicologia inserido na Política Pública de Assistência Social na região no extremo oeste do Paraná” (Santos, et al., 2019). Os resultados dessa pesquisa foram publicizados por meio da I Jornada de Psicologia na Assistência Social de Foz do Iguaçu, realizada em agosto de 2019 e evidenciaram que 64% dos profissionais que responderam ao questionário relataram possuir entre 26 e 35 anos, e 54% dos mesmos estavam entre o 4º e 7º ano de atuação profissional.
A política pública de Assistência Social foi se construindo em paralelo a formação profissional de muitas psicólogas que hoje atuam em seus serviços e ainda percorre o caminho para sua consolidação, já está travando batalhas contra seu desmonte. Dos profissionais do extremo oeste do Paraná que responderam a pesquisa, aproximadamente 95% indicaram que receberam pouca ou nenhuma formação acadêmica sobre política pública de Assistência Social que pudesse o auxiliar no seu campo de atuação profissional cotidiano. E, ao que tudo indica esse campo de atuação ainda não ganhou destaque suficiente nos ambientes acadêmicos e de formação profissional.
Desde que o profissional de psicologia se tornou obrigatório nas equipes de referência dos serviços socioassistenciais, reconhece-se a importância ético-profissional dessa categoria e surgem vários desafios cotidianos aos profissionais de psicologia que abrangem aspectos relacionados ao conhecimento geral de políticas públicas, postura intersetorial, diferenciação de práticas clínicas, institucionalizantes, judiciárias, reconquista diária do campo profissional, defesa, garantia e promoção de direitos humanos. Embora se tenha avançado com relação a materiais e referenciais para atuação profissional da psicologia na política de Assistência Social, muito ainda há que se construir e desconstruir. Os desafios cotidianos exigem constante avaliação e reflexão das práticas “psis” considerando que se pode entender que a psicologia ainda se encontra num processo de construção de identidade profissional no SUAS. Pensando desse modo, é natural que, num momento de tamanha incerteza e surpresa como uma pandemia, a busca de adequação da atuação profissional às situações de emergências seja percebida como angustiantes às psicólogas atuantes nesta política pública.
Em dezembro de 2019, houve a identificação de um novo coronavírus (SARS-CoV-2), inicialmente na cidade de Wuhan, na China, que causou a COVID-19 e ganhou velocidade na sua disseminação e transmissão de pessoa a pessoa, espalhando-se pelo mundo. No final de fevereiro de 2020, essa onda de contaminação chegou ao Brasil e então o país começou a viver as incertezas de uma pandemia com alto grau de letalidade ao mesmo tempo em que vivenciava um momento de grande fragilização das políticas públicas como um todo, especialmente a Assistência Social.
A não observância das questões sociais na garantia dos recursos públicos já vinha preocupando os profissionais da Assistência Social, que buscam diariamente a criação de estratégias para melhor atender a parcela da população que dela necessita, de forma a continuar o enfrentamento das situações de violação de direitos e vulnerabilidades sociais, compostas pelas mais variadas formas de violência e contra qualquer forma de opressão mesmo que em meio ao desmonte desta política.
As questões sociais que são campo de atuação do SUAS se agravam frente à possibilidade de contaminação pela COVID-19, e os reflexos das medidas de contenção de sua proliferação. Questões como a fragilização das leis trabalhistas, as violências institucionais, violência contra mulher, crianças, adolescentes, idosos e pessoas com deficiência, a invisibilidade da população em situação de rua, da negritude e das pessoas LGBTQI+ entre outras, carecem de atenção especial, considerando que devem se agravar diante das alternativas para contenção da proliferação do vírus, como o isolamento social.
Importante ressaltar que a PNAS (Brasil, 2004, p.38) aponta que uma das formas de prevenir vulnerabilidades e riscos sociais é “[…] por meio do desenvolvimento de potencialidades e aquisições, e o fortalecimento de vínculos familiares e comunitários”. Assim sendo, dentro dos Serviços da Assistência Social busca-se potencializar a proatividade, autonomia, habilidades emancipatórias e as capacidades já presentes no repertório comportamental do sujeito. Neste sentido o convívio é uma ferramenta de proteção social, que possibilita a troca de experiências, o desenvolvimento da empatia e tornar a pessoa mais crítica com relação a sua realidade, potencializando a efetivação da garantia de direitos (Brasil, 2016). Deste modo, o isolamento além de afetar as relações pessoais, devido à redução de possibilidades de contatos pessoais, também dificulta a ação de uma das ferramentas utilizadas para a proteção social.
Sabe-se que a maioria dos casos de violência contra crianças e adolescentes, por exemplo, são praticados muitas vezes por pessoas próximas, e que deveriam representar figura de proteção. Com o isolamento social devido à pandemia, muitas crianças e adolescentes podem estar expostas à violência. Além de um possível aumento das situações de violência, preocupa-se com relação à realização das denúncias e encaminhamentos à rede de proteção considerando que muitos dos casos denunciados tinham como porta de entrada escolas, serviços de saúde, atividades coletivas de contra-turno, entre outros, que por ora podem se encontrar suspensos ou com atividades remotas.
Ao falarmos em desproteções consideramos também as questões da população de rua, que abrange um número crescente de pessoas no país e em região de fronteira não é diferente. Este público é alvo de programas e políticas nacionais para sua atenção desde 2009, a partir da implementação da Política Nacional para População em Situação de Rua (PNPR), política esta que, com o desmonte dos serviços vivenciados nos últimos anos, tem sofrido fragilização. Diante disso, dentre as orientações médicas para evitar a disseminação do vírus estão: manter o isolamento e distanciamento social, lavar as mãos frequentemente e usar álcool em gel, e não há dúvidas sobre a importância de tais recomendações, mas o questionamento surge quando nos confrontamos com aqueles que não possuem residência, estão em trânsito ou migrando de estado/país ou pelas mais variadas questões momentaneamente estão em situação de rua.
Como tomar as medidas de segurança, conforme as orientações se não há residência fixa, diante dessa emergência sanitária, nos leva à reflexão sobre como são tratados historicamente aqueles que vivem abaixo da linha da pobreza.
Diante do exposto, neste momento se enfrenta um estado de emergência, e embora o contágio ocorra democraticamente, as taxas de mortalidade não são em nada democráticas e populações de diferentes camadas da sociedade estão sujeitas a maiores e menores riscos. Estar isolado no conforto de uma residência fixa, sem situações de risco agregadas e poder optar por estratégias diferentes de trabalho pode fazer diferença entre a vida e a morte. Ter acesso a equipamentos adequados de saúde, medicamentos e a uma alimentação saudável também são aspectos que podem garantir uma sobrevida, assim como o acesso a saneamento básico e produtos de higiene corporal e doméstica são outros fatores nessa balança de riscos. Cientistas das Universidades Federais do Rio Grande do Norte (UFRN) e do Ceará (UFC) pesquisaram as taxas de transmissibilidade e mortalidade no município de Natal/RN, e associaram os dados coletados pelo número de pessoas contaminadas e o número de mortes, e chegaram à conclusão de que a possibilidade de uma pessoa morrer pela COVID-19 depende da localidade de sua residência (Lacerda, J., Ramalho, L., Lima, L., Valentim, R. & Silva, R., 2020). As informações epidemiológicas foram coletadas por meio de dados de geoprocessamento dos casos e óbitos naquela região, e dão sustentação para refletirmos sobre estas questões de maior vulnerabilidade em todo o país.
Conforme observado nas interações entre profissionais da psicologia de diferentes regiões do Paraná através das ações das Comissões de Psicologia na Assistência Social do Conselho Regional de Psicologia, vivemos momentos parecidos independentemente do tamanho e nível de gestão dos municípios. O olhar destes profissionais sobre determinados fenômenos vivenciados foi importante para a reflexão sobre a qualidade dos atendimentos e a garantia de direitos dos usuários desta política pública.
Este cenário atual demanda que as categorias profissionais desenvolvam novas estratégias de atendimento, de intervenções, de sensibilização com a comunidade, de divulgação de canais de denúncia em parceria com o Sistema de Garantia de Direitos, a fim de minimizar os impactos decorrentes do isolamento social e de um possível aumento de violações de direitos, principalmente com o público mais vulnerável.
O sofrimento humano faz parte do campo de interesse da Psicologia, e ao atuar na Assistência Social a profissional não foge à regra ao trabalhar com as desproteções sociais e as mais variadas situações de vulnerabilidade humana que refletem em sofrimento e interferem nas relações sociais. Especialmente em meio a uma pandemia de grandes proporções, surgem medos, inseguranças e ansiedades que circulam entre os cidadãos que chegam até os Serviços em busca de respostas emergenciais para as suas mais variadas angústias e necessidades.
Se considerarmos que a construção de metodologias de atendimento na Política Pública de Assistência Social exige uma abordagem interdisciplinar, portanto não deveríamos nos preocupar em especificar exatamente qual o papel de cada profissional dentro da Assistência Social, mas sim atentarmos ao que de fato deve se ocupar a atenção social. Se percebermos que lidar com as questões que vão desde a ausência de renda, aos sofrimentos psíquicos em decorrência das vulnerabilidades sociais, ou a desproteção do Estado e da sociedade entre outras, fazem parte dos cotidianos de todos os trabalhadores desta política pública, certamente teremos clareza de que precisamos fazer entender sobre a contribuição da ciência Psicologia no fazer da Assistência Social e não especificamente sobre o papel da Psicóloga neste cotidiano.
A atenção psicossocial proposta pela política pública de Assistência Social está na base das necessidades humanas nos momentos de emergência. Preocupar-se com um acolhimento satisfatório e efetivo ao garantir o protagonismo do cidadão na superação das situações de fragilidades está no escopo da inserção da Psicologia nesta prática.
A pirâmide de International Accounting Standards Committee (IASC) formulada pelo Comitê Permanente Interagências da Organização das Nações Unidades (ONU), para auxiliar atores do planejamento e intervenção de ações multissetoriais com intuito de proteger e melhorar a saúde mental, assim como o bem-estar psicossocial das pessoas em situações de emergência, traz na base das intervenções os serviços básicos, logo acima o apoio a comunidade e as famílias (Inter-Agency Standing Committee – IASC. Comitê Permanente Interagências, 2007).
Figura 1– Pirâmide de intervenções para os serviços de saúde mental e apoio psicossocial em emergências
Fonte: Inter-Agency Standing Committee – IASC. Comitê Permanente Interagências (2007, p. 12).
Neste sentido observamos que garantir a continuidade dos atendimentos do SUAS e a presença como referência nos territórios é a garantia de atender a ansiedade do usuário sem exacerbar a sensação de desamparo e sua não pertença à política pública. Um acolhimento de qualidade, orientação assertiva e o direcionamento dos indivíduos e famílias ao acesso de seus direitos neste momento devem compor a base de qualquer planejamento de intervenção à situação de emergência. Compreender este contexto nos permite ampliar o olhar diante de tarefas tradicionais do trabalho na assistência social, onde por vezes observamos colegas profissionais desconfortáveis questionando sobre como “psicologizar” diante da entrega de um benefício eventual na atenção básica, na orientação sobre tarefas do cotidiano nos acolhimentos institucionais, ou no encaminhamento e orientação remota aos usuários na atenção especial.
A Psicologia sozinha não possui condições de dar respostas a todas as questões da situação pandêmica vivenciada, bem como para os reflexos deste momento histórico ao longo dos próximos anos nos fazeres da atenção social. Desta forma, extrapolar a lógica da clínica e romper com as práticas tradicionais de atendimento propostas pela academia é ainda mais urgente ao refletirmos sobre a prática da Psicologia na Assistência Social.
No que tange à atuação das profissionais de psicologia inseridas na Proteção Social Especial, especificamente atuantes no Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS) em Foz do Iguaçu, observou-se relatos de que os atendimentos foram mantidos, avaliando os casos de situações de risco e observando as recomendações de distanciamento, instrução operacional e outras orientações de vigilância epidemiológica. Ainda, as equipes ampliaram a realização de estudos de casos por aplicativos de reuniões, contatos telefônicos, divulgação sobre os serviços e intensificaram a articulação com a Proteção Social Básica, órgãos do Sistema de Garantia de Direitos bem como com as demais políticas, principalmente saúde e educação.
A proteção básica, por sua vez, também sofreu alterações em sua lógica de atendimento. Por serem referência nos territórios, os CRAS se perceberam com aumento significativo de demanda, em um curto espaço de tempo equipes mínimas que se viram ainda mais desfalcadas em razão dos afastamentos de profissionais por constarem no grupo de risco da COVID-19, precisaram encontrar estratégia para absorver centenas de atendimentos em busca de informações, seja ela para acesso a benefícios eventuais do próprio serviço ou de cidadãos com dificuldade de acesso ao auxílio emergencial e outros direitos diante da burocracia imposta pelo Estado para seu acesso.
Práticas coletivas como as atividades presenciais do Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV) precisaram ser suspensas, devido a Decretos Municipais, isso, no entanto, não anula a necessidade de atendimento à família que deve fazer parte do Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família (PAIF), portanto alternativas de acesso e trabalho de alguns temas pertinentes a cada público atendido precisaram ser pensadas, como por exemplo, publicações públicas em redes sociais dos equipamentos e ampliação do atendimento pelas linhas telefônicas. Estratégias estas que em diversos momentos foram submersas em meio à necessidade imediata do atendimento presencial da população no CRAS, mas que ainda assim sinalizaram a busca das profissionais em manter os acompanhamentos PAIF e suas características de trabalho social no âmbito da prevenção e proteção.
Outra face de atuação profissional significativa das Psicólogas atuantes na política pública de Assistência Social é a participação nas instâncias de controle social. O Conselho Regional de Psicologia do Paraná possui titularidade na representação da sociedade civil pelo segmento dos trabalhadores no Conselho Municipal de Assistência Social (CMAS) no município de Foz do Iguaçu. O CMAS visa à promoção do monitoramento da política de Assistência Social e a defesa dos direitos humanos. Sendo uma instância do controle social, onde ocorrem análises e discussões coletivas dos planos e orçamentos dentro dessa esfera, a participação é de suma importância, principalmente neste contexto de pandemia, pois se assegura o cumprimento de suas deliberações como fiscalização, avaliação e acompanhamento dos desempenhos de órgãos públicos, entidades, programas sociais e dos recursos. Assim, devido às condições vulneráveis que se encontra a população é necessário que haja o combate às violações de direitos aos usuários, defender condições seguras e pelo cumprimento das funções dos trabalhadores do SUAS e a garantia de qualidade dos serviços prestados.
Em meio à atuação com demais categorias profissionais e diante da emergência do atendimento à população, as psicólogas atuantes na Assistência Social têm construído um olhar sobre como a psicologia pode contribuir de forma estratégica nestes contextos, ampliando a capacidade de entendimento das equipes sobre os aspectos subjetivos que surgem frente à necessidade de superar as incertezas e as desproteções sociais deste momento histórico.
É fato, adaptações precisaram ser realizadas considerando a pandemia pela COVID-19. Não havia qualquer ator da política de assistência social, sendo gestor dos serviços ou profissional na linha de frente dos atendimentos que estivesse preparado para criar estratégias de enfrentamento na mesma velocidade em que se agravaram as questões sociais neste período. Novamente práticas de cunho assistencialistas exclusivamente ganham espaços e prioridades em agendas governamentais, como meio de minimizar os efeitos da crise econômica, sanitária, social e humana. Aos profissionais de psicologia intensifica-se a preocupação em encontrar modos de acolher as emergências da população sem descaracterizar a política pública de Assistência Social e garanti-la enquanto direito. Nesse sentido, além da garantia da distribuição de benefícios eventuais é preciso que o acolhimento na Assistência Social, além de atender às questões que se apresentem como emergenciais, valorizem “os aspectos subjetivos e intersubjetivos dessas pessoas. À Psicologia, cabe uma intervenção que dê voz a essas dimensões” (Costa & Cardoso, 2010, p. 227). Dessa forma, neste contexto é necessário garantir o acolhimento de qualidade de forma a agregar aos atendimentos de rotina aqueles que serão emergenciais e mantendo o acompanhamento sociofamiliar.
Os profissionais da Assistência Social devem possuir um diagnóstico amplo de seu território de atuação, dessa forma, é necessário, portanto, considerar o que já se conhece, dentro de uma rede já existente, considerar como a própria população costuma se organizar e quais as estratégias de cuidado seriam mais efetivas e possíveis de serem intensificadas analisando as características do público local. Para pensar em estratégias para uma intervenção de qualidade é necessário entender como o território se organiza, quais as demandas mais presentes e quais as questões sociais que envolvem determinado território, desenvolvendo uma análise crítica destes fenômenos.
Além das questões do atendimento à população, se torna importante ainda atentar para o autocuidado da profissional, cuidar de si para experienciar o cuidado com o outro, frente a isso os espaços coletivos de discussão dos processos de trabalho, de estudo e de troca de experiências, como exemplo a Comissão de Psicologia na Assistência Social do CRP/PR auxiliaram as profissionais a elaborar as angústias e melhor organizar as ideias em torno do propósito maior que é promover a atenção psicossocial ao usuário da Assistência Social. Outros espaços coletivos de troca e construção podem ser fomentados nos Municípios, como Fóruns dos Trabalhadores da Assistência Social, Conselhos de Direitos e mesmo outros espaços da categoria profissional.
A atuação profissional na assistência social sempre trouxe desafios e diversas inquietações às profissionais dos serviços e neste momento de pandemia não seria diferente. Ousa-se pensar que muitas estratégias serão necessárias ainda de serem discutidas, refletidas, avaliadas e monitoradas diante da realidade durante e pós pandemia, o que nos faz pontuar aos gestores a necessidade de uma atenção ainda maior ao usuário da política de assistência social, e também aos trabalhadores que permanecem e permanecerão na linha de frente dos serviços essenciais, o que se pode fazer promovendo estratégias que deem suporte, garantam a autonomia profissional, e fomentando linhas de comunicação claras e apoio efetivo no desempenho dos atendimentos.
Por fim, entendemos que diante de um cenário de emergências, frente a uma nova realidade na Assistência Social, a Psicologia vem construindo seu caminho e reafirmando sua importância na composição das equipes mínimas dos serviços socioassistenciais. Atuar em meio a uma pandemia de proporções mundiais e de desafios singulares tem sido desafiador e provocado reflexões, mesmo aos acostumados a trabalhar com as mais severas desproteções e violações de direitos. Esta reflexão provocada certamente verbaliza com as premissas da Psicologia e fará parte da evolução do conhecimento para uma atuação mais humanizada e estratégica.
[1] Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais, Resolução nº 109, de 11 de novembro de 2009 (Brasil, 2009).
[2] Resolução CNAS nº 33 de 12 de dezembro de 2012 (Brasil, 2012).
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