Resumo: As reformas educacionais da década de 1990, influenciadas por políticas neoliberais, impactaram as condições de trabalho dos professores da rede pública no Brasil, levando à precarização da educação e ao gerencialismo escolar. Esses fatores contribuíram para o adoecimento mental dos docentes. Este estudo visa identificar as doenças mentais mais prevalentes entre professores da educação básica, os fatores de risco, sinais e sintomas de adoecimento, além de verificar estratégias de enfrentamento organizacional e política. A pesquisa bibliográfica, realizada na plataforma SciELO, incluiu artigos publicados entre 2021 e 2023, abordando a saúde mental dos professores no contexto da educação pública. O estudo destaca a necessidade de repensar o sistema educacional, especialmente no contexto pós-pandemia, em que o retorno às aulas presenciais trouxe novos desafios. Sugere-se a promoção contínua da saúde mental docente, melhores condições de trabalho e suporte psicológico.
Palavras-chave: docentes; saúde mental; Educação pública.
TEACHING WORK, MENTAL HEALTH AND ILLNESS IN THE PUBLIC SCHOOL SYSTEM
Abstract: Educational reforms in the 1990s, influenced by neoliberal policies, impacted the working conditions of public school teachers in Brazil, leading to the precarization of education and the introduction of school managerialism. These factors contributed to the mental illness of teachers. This study aims to identify the most prevalent mental illnesses among basic education teachers, the risk factors, signs, and symptoms of illness, as well as to verify organizational and political coping strategies. The literature review, conducted on the SciELO platform, included articles published between 2021 and 2023, addressing teachers’ mental health in the context of public education. The study highlights the need to rethink the educational system, especially in the post-pandemic context, where the return to in-person classes brought new challenges. Continuous promotion of teachers’ mental health, better working conditions, and psychological support are suggested.
Keywords: teachers; mental health; public education.
TRABAJO DOCENTE, SALUD MENTAL Y ENFERMEDAD EN LA ESCUELA PÚBLICA
Resumen: Las reformas educativas de los años 90, influidas por las políticas neoliberales, repercutieron en las condiciones de trabajo de los profesores de las escuelas públicas de Brasil, provocando la precarización de la enseñanza y el gerencialismo escolar. Estos factores han contribuido a la enfermedad mental de los profesores. Este estudio tiene como objetivo identificar las enfermedades mentales más prevalentes entre los profesores de enseñanza primaria, los factores de riesgo, los signos y síntomas de enfermedad, y verificar las estrategias organizativas y políticas de afrontamiento. La investigación bibliográfica, realizada en la plataforma SciELO, incluyó artículos publicados entre 2021 y 2023, abordando la salud mental de los profesores en el contexto de la educación pública. El estudio destaca la necesidad de repensar el sistema educativo, especialmente en el contexto post pandémico, en el que el retorno a las clases presenciales ha traído nuevos desafíos. Sugiere la promoción continua de la salud mental de los profesores, mejores condiciones de trabajo y apoyo psicológico.
Palabras-clave: profesores; salud mental; educación pública.
Introdução
H á muitos aspectos que determinam um sistema educacional de sucesso, através de uma reflexão mais profunda, decidimos expor o tema Trabalho Docente, Saúde Mental e Adoecimento na Rede Pública Básica de Ensino, que consiste em o primeiro momento da construção acadêmica infantil e jovem, que englobam a Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio. A saúde mental dos alunos e seu desempenho acadêmico tem uma relação com a saúde mental dos professores, a iniciação com seus mestres, no qual o docente funciona como modelo de resolução de problemas, suas emoções, sentimentos e comportamentos, refletem em sala de aula influenciando os que estão a sua volta, o educador acompanha a criança desde muito cedo, auxiliando na identificação de elementos que possam ser importantes, funciona como uma figura fundamental no manejo de situações complexas que acontecem dentro da sala de aula.
O trabalho da docência, portanto, constitui-se de relações sociais e identidades, uma vez que através do processo ensino-aprendizagem e das relações estabelecidas na escola, os professores interagem na dinâmica social, participando da sociedade, e contribuindo para a formação humana, cidadã e técnica de sujeitos. (Cunha et al., 2021, p.3). Discorrer a respeito da saúde mental dos professores nos leva a pensar sobre a saúde mental da criança, adolescente e da comunidade em geral; é necessário que os professores tenham um autocuidado, conhecimento e auto gestão, sabendo lidar com o novo e as intemperanças do ambiente de trabalho, podendo assim ter mais sucesso em sua atividade laboral, quando o professor tem essa possibilidade em enxergar a gama de emoções que necessita lidar no dia a dia, traz um melhor resultado no manejo do desenvolvimento não apenas de si próprio mas de todo o contexto que o cerca.
A satisfação com o trabalho pode ser positiva para à saúde do trabalhador, assim como a insatisfação pode trazer prejuízos tanto para a saúde quanto para a organização ou instituição em que ele está inserido (Vieira et al., 2023). O professor, enquanto modelo para os estudantes, tem um papel crucial. Ao apresentar uma saúde mental mais equilibrada, ele facilita o processo de aprendizagem dos alunos, ajudando-os a compreender e se desenvolver de forma mais significativa. Além disso, contribui para desconstruir o estigma de que a saúde mental se limita aos transtornos, quando, na verdade, é algo presente no cotidiano de cada sujeito e que exige uma construção diária.
É de suma importância abordar essa temática dentro do currículo escolar, juntamente com um trabalho de humanização da figura docente. Desconstruir o rótulo do professor como “salvador do futuro” é essencial, pois essa humanização permite compreender que o bem-estar mental do professor influencia diretamente no processo de ensino-aprendizagem. Quando a saúde mental do docente está prejudicada, isso impacta sua presença e interação com os alunos, e reflete até na forma como ele percebe e interpreta o ambiente escolar, muitas vezes com uma tendência a enxergá-lo de maneira mais caótica do que realmente é.
Através da atividade laboral, a humanidade molda seu próprio progresso ao interagir com o meio ambiente. O economista alemão Karl Marx, desde o século XIX, destacava a interligação entre a biologia humana e a criação social resultante do trabalho. O ser humano se desenvolve ao manipular conscientemente a natureza para alcançar objetivos específicos, estimulando seu potencial e contribuindo para o avanço da sociedade. Ao contrário dos animais, os humanos não nascem com habilidades inatas; eles adquirem conhecimento socialmente construído para se tornarem plenamente humanos ao longo da história (Tostes et al., 2018).
Para alinhar a discussão com a temática proposta pela revista CadernoS de PsicologiaS n6 – Memórias e histórias da psicologia, é fundamental refletir sobre como as ideias de Vygotsky continuam relevantes no contexto atual, especialmente em relação à construção de narrativas que moldam o futuro. A abordagem histórico-cultural de Vygotsky, ao enfatizar a importância das interações sociais e culturais na formação do sujeito, oferece uma perspectiva crítica sobre como as práticas educativas e sociais contemporâneas podem influenciar o desenvolvimento humano. Esse entendimento não se limita ao passado, mas nos incita a considerar como as políticas educacionais, as relações interpessoais e as tecnologias de comunicação hoje moldam as futuras gerações. A psicologia, ao explorar essas dinâmicas, torna-se uma ferramenta não apenas de compreensão, mas de intervenção no desenvolvimento humano, sugerindo que as histórias que contamos e as memórias que preservamos moldam as possibilidades de transformação social.
Karl Marx (2013) e Lev Vygotsky (1991), apesar de terem vivido em épocas diferentes e abordado aspectos distintos da teoria social, ambos reconhecem a importância do contexto social na formação do indivíduo e na construção do conhecimento. Marx enfatiza a influência das relações de produção e das estruturas econômicas na vida das pessoas, enquanto Vygotsky destaca o papel das interações sociais e da cultura no desenvolvimento cognitivo e na aprendizagem. Ambos os pensadores enfatizam que a criação social é fundamental para entendermos como os indivíduos se tornam parte de uma sociedade e como o conhecimento é construído e compartilhado dentro dela.
Neste sentido, a escola desponta como um importante ambiente para esta construção social, uma vez que é crucial transmitir esse conhecimento às próximas gerações para perpetuar o desenvolvimento humano, essa transferência de conhecimento ao longo da história, de uma geração para outra, desempenhou um papel vital no progresso humano, culminando na educação formal, onde as escolas têm a responsabilidade de cultivar a humanidade em cada indivíduo, como afirmado por Saviani (1991, p. 67):
Elaboração do saber não é sinônimo de produção do saber. A produção do saber é social, ocorre no interior das relações sociais. A elaboração do saber implica expressar de forma elaborada o saber que surge da prática social. Essa expressão elaborada supõe o domínio dos instrumentos de elaboração e sistematização. Daí a importância da escola: se a escola não permite o acesso a esses instrumentos, os trabalhadores ficam bloqueados e impedidos de ascender ao nível da elaboração do saber, embora continuem, pela sua atividade prática real, a contribuir para a produção do saber.
De acordo com Tostes et al. (2018), se olharmos para a história da educação, vemos que na Antiguidade a escola estava focada na preparação militar, enquanto na Idade Média se concentrava na vida religiosa dos monges e no código de conduta cavalheiresco dos nobres. Com o surgimento do capitalismo, a escola se tornou ainda mais crucial, pois passou a ser responsável por treinar e preparar ideologicamente a força de trabalho que impulsionaria a produção, resultando no rápido desenvolvimento que caracteriza esse modo de produção. O papel do professor se tornou fundamental na transmissão do conhecimento acumulado pela humanidade, impulsionando o avanço da sociedade e da ciência, tornando o domínio do conhecimento menos crucial para a maioria das profissões. No entanto, a crise do capitalismo na década de 1970 levou a uma intensificação da globalização e ao predomínio do neoliberalismo. Isso provocou mudanças significativas na economia, com a introdução de tecnologias inovadoras e novos métodos de trabalho, exigindo um novo tipo de trabalhador mais adaptável e multifuncional.
Essa análise sobre a necessidade de flexibilidade e empregabilidade ao longo da vida pode ser uma excelente oportunidade para explorar a inserção da psicologia na educação, tanto de forma direta quanto indireta, a partir de uma perspectiva crítica. Historicamente, a psicologia na educação sempre buscou entender o desenvolvimento humano e como melhorar os processos de ensino e aprendizagem. Contudo, com as rápidas mudanças no mercado de trabalho, o papel da psicologia se ampliou. A psicologia educacional, que inicialmente focava em aspectos como a cognição e o desenvolvimento, agora tem um papel ainda mais central na promoção da saúde mental dentro do ambiente escolar, preparando os alunos não apenas para adquirir conhecimento técnico, mas também para desenvolver habilidades socioemocionais cruciais para enfrentar as pressões e incertezas do mundo moderno. Essa evolução da educação e do papel da psicologia pode ser vista como um reflexo da necessidade de preparar alunos para serem mais do que especialistas em uma área. Eles precisam ser adaptáveis, resilientes, e psicologicamente saudáveis, para lidar com as constantes transformações tecnológicas e sociais. Aqui, o foco da psicologia na educação não se limita apenas ao processo de aprendizagem, mas também inclui a relação educador-educando e a promoção de ambientes que favoreçam o bem-estar emocional. Esse “novo” papel da psicologia educacional que envolve desde intervenções para melhorar o processo de ensino até a promoção de saúde mental cria uma oportunidade para repensar como estamos abordando a formação dos alunos em uma sociedade cada vez mais dinâmica (Nóvoa, 2009).
Diante dessas transformações, a escola precisou se adaptar, preparando os alunos para se tornarem profissionais flexíveis, capazes de aprender rapidamente novas habilidades. O foco já não está apenas na preparação para um emprego específico, mas sim na capacidade de se manter empregável ao longo da vida. Isso implica menos ênfase no conhecimento científico tradicional e mais foco na capacidade de se adaptar às demandas do mercado, especialmente aquelas relacionadas à tecnologia. Em suma, a formação do novo trabalhador requer menos conhecimento teórico e mais habilidades práticas, alinhadas às necessidades do capitalismo neoliberal. Os professores enfrentam a responsabilidade de promover uma cultura individualista dominante enquanto encarnam as expectativas de ascensão social das classes populares. Embora o papel da escola seja formar indivíduos críticos e autônomos, capazes de transformar a sociedade e melhorar sua qualidade de vida, mudanças no cenário social e econômico têm modificado o papel do professor e aumentado as exigências sobre sua eficácia professional (Tostes et al. 2018).
Segundo Oliveira (2019), essa dualidade é descrita por Marx como a distinção entre o trabalho concreto, que produz bens úteis e é essencial para a humanidade, e o trabalho abstrato, que é simplesmente um meio de gerar lucro, sem significado intrínseco para o trabalhador, e pode levar ao adoecimento.
O seguimento educacional se acentua, reduzindo o acesso ao conhecimento científico para uma parcela cada vez menor da população. A escola contemporânea perde sua ênfase na formação técnica da força de trabalho, assumindo mais a responsabilidade de moldar ideologicamente os trabalhadores à nova ordem. Nesse contexto, o papel do professor como transmissor de conhecimento acumulado torna-se menos relevante (Frota, 2022).
Neste contexto de mudanças e disputas no sistema educacional, especificamente na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) de 1996, ocorreu uma diminuição da estabilidade da profissão docente. Isso resultou em uma situação em que os professores, em termos financeiros, passaram a ser vistos como trabalhadores com um grau de flexibilidade, variedade e versatilidade em suas funções. Seu tipo de contrato tornou-se mais instável, e aqueles com contratos permanentes viram uma redução significativa em seus direitos trabalhistas formais (Frota, 2022). A mesma “flexibilidade” que é objeto da formação escolar aos alunos ganham terreno na gestão educacional e na situação laboral dos professores.
A escola passa a ser pensada como empresa privada, com uma gestão gerencialistas e os professores são vistos como responsáveis pelas atribuições cumulativas, pelo perfil de rendimento (professores com inúmeras funções) e de avaliação de desempenho contínua. Os recursos destinados ao trabalho do professor, como espaços/infraestruturas escolares, estruturas e materiais didático pedagógicos são reduzidos; e os salários apresentam se incompatíveis com a demanda de trabalho. E na atividade laboral docente de ritmo intenso, repetitivo, repleto de múltiplas tarefas e jornadas de trabalho exaustivas o professor do ensino básico é exposto rotineiramente a situações que comprometem sua saúde física e/ou psíquica, decorrentes da estrutura e organização do seu trabalho (Cunha et al., 2021, p. 4).
O conceito de bem-estar mental vai além do indivíduo e engloba uma rede de elementos interligados. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o bem-estar mental é um estado de equilíbrio experimentado pela pessoa, permitindo o desenvolvimento de suas capacidades para lidar com os desafios da vida e contribuir para a comunidade. O bem-estar de um indivíduo está intimamente ligado a uma série de condições essenciais, que vão muito além do aspecto puramente psicológico. Além dos fatores individuais, o bem-estar mental é também influenciado pelo contexto social (Organização Mundial da Saúde, 2002). Portanto, é importante reconhecer que o bem-estar mental é resultado da interação entre fatores biológicos, psicológicos e sociais. Pode-se dizer que o bem-estar mental possui características biopsicossociais (Pereira et al., 2011).
Junto a falta de instabilidade ensejada pela LDB, o declínio do prestígio, a falta de valorização e a precarização da ocupação docente estão diretamente relacionados aos problemas de saúde mental. A falta de reconhecimento pelo trabalho realizado pode causar angústia e desconforto levando à deterioração da saúde. Criticam a abordagem do estresse, que muitas vezes se concentra apenas nas reações físicas do corpo, chamando-a de reducionista. Preferem usar o termo desgaste. Além disso, ressaltam que as relações de poder podem causar danos à saúde mental, levando à perda de confiança e consequências físicas, que podem se tornar crônicas e levar ao adoecimento. Esses aspectos podem desencadear transtornos mentais relacionados ao ambiente de trabalho (Neves & Silva, 2006).
No Brasil, estudos sobre a interação entre saúde mental e trabalho estão em andamento desde os anos 1980. Observam que o trabalho dos professores oferece alguma proteção devido ao seu valor social. No entanto, a satisfação no trabalho é essencial para evitar o mal-estar e o adoecimento, especialmente quando há um senso de coletividade entre os profissionais. Por outro lado, o trabalho dos professores tem impactado negativamente em sua saúde mental devido à sobrecarga de tarefas burocráticas, pressões e restrições à liberdade de ensinar e pensar. Em suma, as questões relacionadas à organização do trabalho, como salas de aula superlotadas, restrições temáticas e controle excessivo, contribuem para o esgotamento e a deterioração da saúde mental dos professores (Neves & Silva, 2006).
O professor, em seu trabalho, enfrenta inúmeros desafios e assume grandes responsabilidades, constituindo uma das categorias profissionais mais sujeitas a apresentar sofrimento mental. A Organização Internacional do Trabalho (2024) aponta a categoria docente como sendo a segunda a apresentar doenças ocupacionais. A literatura demonstra fartamente que a acentuação da exploração e precariedade das condições de trabalho tem resultado em grave prejuízo à saúde de professores e demais trabalhadores. Porém, observa-se um crescente adoecimento entre os docentes nas últimas décadas, e um grande número de pesquisas aponta para o sofrimento mental como uma das formas mais prevalentes deste adoecimento, ligado às novas condições de trabalho (Tostes et al., 2018).
Sob esse sistema capitalista, o trabalhador, ao vender sua força de trabalho, torna-se uma mera manifestação subjetiva do capital, perdendo sua identidade e autonomia, onde os trabalhadores são explorados e desumanizados enquanto os detentores do capital acumulam poder e riqueza. Afetando toda classe trabalhadora como por exemplo a diminuição da valorização do papel do professor na educação e o aumento do foco na preparação de uma força de trabalho flexível, voltada principalmente para a empregabilidade, tornam o trabalho docente menos significativo e têm um impacto negativo na saúde dos professores (Frota, 2022).
Dessa forma, a atividade laboral da docência, na educação básica, é muito influenciada pelo contexto social e político no Brasil, e por conta dessa influência nas condições de trabalho do professor o adoecimento tem afetado um grande número desses trabalhadores. Esses adoecimentos são processos cumulativos, gerados por uma perene sensação de mal-estar, desilusão e frustação com o próprio trabalho. A falta de identificação com a docência, os estímulos para o trabalho docente e o exercício da desesperança são confluências que resultam nas várias formas de adoecimento dos docentes. O adoecimento físico e mental dos professores tem se tornado um problema de saúde pública e desta forma, faz-se necessário compreender esse processo buscando um entrelaçamento entre saúde-doença, condições sociais e de trabalho dos professores, e a sua relação com a esfera política (Cunha et al., 2021, p. 5).
Para caracterizar o sofrimento dos professores, fartamente evidenciado e manifestado por meio de um conjunto de sinais do corpo e da psique, como estresse, ansiedade, depressão e fadiga, efeitos negativos da atividade docente na atualidade, introduziu-se a expressão mal-estar docente. Este é um fenômeno mundial, que acontece concomitantemente a mudanças econômicas de ordem global.
Entre docentes, a depressão representa o mais prevalente transtorno mental, sendo apontada como a causa de mais da metade dos afastamentos do trabalho de professores da educação básica. Estudos nacionais têm verificado taxas de prevalência de Sintomas Depressivos (SD) entre professores do ensino público variando entre 21,6% e 50%, valores consideravelmente mais altos do que os verificados noutros grupos (Vieira et al., p. 2076).
Segundo Santos (2022), a pandemia de 2019, causada pelo novo coronavírus, expôs desafios significativos para setores como a educação, que teve que adaptar-se ao ensino remoto. Embora o teletrabalho tenha surgido como uma solução, trouxe consigo a perda do contato social, levando a relações mais distantes mediadas pela tecnologia. Isso resultou em um aumento na carga de trabalho, ansiedade, estresse e depressão entre os professores, podendo afetar negativamente diversos aspectos de suas vidas e desempenho profissional, até mesmo levando ao abandono da profissão.
O contentamento no trabalho, a percepção que o trabalhador tem de sua ocupação ou a realização de seus princípios através dessa atividade expressam a visão individual e subjetiva de quanto um trabalhador aprecia sua função laboral. É um conceito intrincado, influenciado por diversos aspectos relacionados ao trabalho que interagem com as condições de vida e saúde. A satisfação no trabalho pode ser benéfica para a saúde, enquanto a insatisfação pode causar danos à saúde do trabalhador e à organização/instituição em que ele está inserido. O excesso de responsabilidades, sem um gerenciamento adequado, pode levar o trabalho a ser percebido como um fardo, resultando na perda de realização pessoal, esgotamento e insatisfação. Portanto, a satisfação no trabalho e a saúde mental estão interligadas e se influenciam mutuamente, já que se o indivíduo não estiver contente com as condições do trabalho, sua saúde mental será afetada, e vice-versa (Vieira et al., 2023).
Com o intuito de alcançar os objetivos propostos, optou-se por conduzir uma pesquisa empregando o método de revisão da literatura. Esta pesquisa foi realizada de maneira sistemática, abarcando uma vasta gama de fontes, tais como artigos acadêmicos, obras literárias, teses e dissertações, visando garantir uma perspectiva abrangente e diversificada das opiniões e abordagens acerca do tema em questão.
Os critérios de seleção adotados para a escolha dos materiais incluíram a restrição a um máximo de três artigos, a atualidade dos mesmos publicados nos últimos três anos, o enfoque em relatos de investigação, a abordagem específica da relação entre trabalho e saúde mental docente, a disponibilidade na biblioteca eletrônica Scielo para assegurar a qualidade, o idioma português, a abrangência nacional e o foco direcionado aos professores da educação básica.
No entanto, lamentavelmente, a pesquisa na plataforma da Scielo revelou uma escassez de opções que atendessem aos critérios estabelecidos, particularmente no que diz respeito à diversidade geográfica e a publicação nos últimos três anos, optamos por dois estudos identificados no estado de Minas Gerais e um abrangendo os estados da Bahia e Sergipe.
Os três artigos selecionados para análise foram os seguintes: Vivências, Condições de Trabalho e Processo Saúde-Doença: Retratos da Realidade Docente, Inter-relações entre Insatisfação com o Trabalho Docente e Sintomas Depressivos: Modelagem com Equações Estruturais e Pandemia da COVID-19, Saúde Mental, Apoio Social e Sentido de Vida em Professores.
A escolha da plataforma Scielo como fonte confiável se deu em virtude de diversos fatores. Primeiramente, os artigos submetidos passam por um processo de revisão por pares, garantindo a qualidade e a precisão do conteúdo. Ademais, a plataforma oferece acesso aberto a uma ampla variedade de artigos científicos, facilitando a disseminação do conhecimento. Muitas das revistas científicas presentes na Scielo são indexadas em bases de dados conceituadas, o que amplia a visibilidade e a reputação dos trabalhos publicados. A credibilidade institucional também é um aspecto relevante, uma vez que a Scielo é respaldada por instituições acadêmicas e governamentais. No contexto deste estudo, os termos trabalho docente, adoecimento, educação básica e saúde mental foram utilizados como palavra-chave para a pesquisa do artigo.
Em síntese, a aplicação do método de revisão bibliográfica, em conjunto com critérios rigorosos de seleção, propiciou a identificação de três artigos pertinentes que discutem a relação entre trabalho docente e saúde mental, fornecendo uma perspectiva abrangente e atualizada sobre o tema. A escolha da Scielo como fonte confiável reforça a credibilidade e a qualidade dos resultados obtidos, contribuindo para uma análise sólida e embasada sobre o impacto do trabalho docente na saúde mental dos professores da educação básica.
Após uma pesquisa nas bases de dados da Scielo, constatou-se uma escassez de artigos recentes abordando a interseção entre o trabalho docente, saúde mental e adoecimento na rede pública básica de ensino nos últimos três anos. Durante a fase inicial de triagem, foram identificados três artigos que se alinhavam com os objetivos desta revisão, com base em seus títulos e resumos. Para facilitar a análise dos dados, elaborou-se uma tabela individual para cada artigo, e seus pontos relevantes, com o propósito de fornecer uma visão simplificada dos mesmos (Santos et al., 2018).
O Quadro 1 transcreve as dimensões analisadas no artigo: Vivências, Condições de Trabalho e Processo Saúde-Doença: Retratos da Realidade Docente (Lopes & Novais, 2023).
Fonte: Elaboração das autoras, baseado em Lopes & Novais (2023).
O propósito deste estudo foi entender os fatores que levam os professores das escolas públicas de Montes Claros-MG a ficarem doentes, considerando suas experiências e condições de trabalho. A pesquisa, baseada no Interacionismo Simbólico e conduzida através do método Grounded Theory, é uma abordagem analítica que busca desenvolver teorias a partir da observação da realidade empírica, priorizando uma descrição detalhada e completa da situação estudada. Participaram da entrevista 12 professores do ensino básico em escolas estaduais. Durante a análise dos dados, foram identificadas sete categorias axiais, que ajudam a explicar os fundamentos teóricos desta investigação. Os resultados indicam que o adoecimento dos professores do ensino básico é influenciado por diversos processos e causas multifatoriais.
Os resultados foram obtidos das histórias dos participantes da pesquisa, o que possibilitou o desenvolvimento de uma teoria central acerca do adoecimento docente, caracterizada por processos e causas, esses principais fatores de adoecimento seriam: Precarização do trabalho docente; Vivência de desvalorização; Impasses na busca da superação do mal estar docente; Conflitos com alunos e familiares; Descompassos na prática docente; Repercussões do trabalho na vida pessoal e Efeitos do processo de trabalho na história de vida.
Em decorrência dos fatores vieram os sinais e sintomas dos adoecimentos os mais relatados na pesquisa: desmotivação, frustração, insatisfação, desvalorização, tensões, sobrecarga, impasses, sentimentos negativos, impotência, desamparo, desinteresse, desprestígio, indisposição, desgaste, desrespeitados, estresse, perda de interesse pelo trabalho, ansiedade, cansaço físico, mental e vocal, estresse crônico, exaustão emocional, estresse ocupacional, depressão, burnout e polipatologias.
Em 2022, a OMS oficializou a Síndrome de Burnout como uma condição relacionada ao trabalho, e a partir de 1º de janeiro de 2023, ela foi incorporada na Classificação Internacional de Doenças (CID-11). Segundo Palmeirim (2023), o Brasil ficou em segundo lugar no ranking global de casos de Burnout em 2021, sendo superado apenas pelo Japão, conforme a Associação Internacional de Gerenciamento do Estresse, uma organização sem fins lucrativos dedicada à pesquisa e ao desenvolvimento de métodos para prevenir e tratar o estresse em todo o mundo.
Codo (1999), argumenta de maneira perspicaz sobre a importância de uma abordagem mais abrangente do trabalho docente, ao afirmar que “Educação não é uma empreitada solitária; ou é uma orquestra, ou não acontece…”. É dessa perspectiva que ele discute a Síndrome de Burnout como um fenômeno que afeta muitos dos professores pesquisados. Assim, Codo (1990, p. 238) define a síndrome:
Burnout […] em português, algo como “perder o fogo” “perder a energia” ou “queimar (para fora) completamente” (numa tradução mais direta). É uma síndrome através da qual o trabalhador perde o sentido da sua relação com o trabalho, de forma que as coisas já não o importam mais e qualquer esforço lhe pareça ser útil. Esta síndrome afeta, principalmente, profissionais da área de serviços quando em contato direto com seus usuários.
A pesquisa revela que os professores do ensino básico em Montes Claros-MG enfrentam uma série de desafios que afetam sua saúde física e mental. A precarização do trabalho, a desvalorização profissional e os conflitos no ambiente escolar são apenas algumas das causas identificadas. Os sintomas relatados, como desmotivação, estresse e burnout, refletem um quadro preocupante de adoecimento docente.
No segundo artigo em estudo: “Inter-relações entre insatisfação com o trabalho docente e sintomas depressivos: modelagem com equações estruturais” (Lopes & Novais, 2023), traz as seguintes informações no quadro 2:
Fonte: Elaboração das autoras, baseado em Lopes & Novais (2023).
Este estudo tem como objetivo analisar as conexões entre diferentes elementos relacionados aos sintomas de depressão em professores de Montes Claros- MG, considerando a insatisfação com o trabalho como um possível fator mediador. Foi realizado um estudo transversal com 700 professores da rede pública de ensino de uma cidade brasileira. O principal resultado observado foi a presença de sintomas depressivos, avaliados através do Inventário de Depressão de Beck. Foram examinadas as relações diretas e indiretas entre os sintomas depressivos e a insatisfação com o trabalho, idade, renda, estilo de vida que foi avaliado pelo instrumento Estilo de Vida Fantástico e o IMC que é um indicador do estado nutricional. Essas variáveis foram incluídas em um modelo operacional e testadas usando modelagem de equações estruturais. De acordo com os fatores de adoecimento estão: inter-relações, insatisfação com o trabalho, alto grau de exigência sofrida, condições precárias de trabalho, desinteresse\agressividade de alunos e suas famílias, pressão no cumprimento de prazos e tarefas, carga de trabalho excessiva, acúmulo de cargos devido ao baixo salário, o estilo de vida e a adiposidade. Principais sintomas e sinais relatados foram: insatisfação, depressão, ansiedade, estresse e adiposidade.
A análise das interconexões entre os sintomas de depressão em professores, com destaque para a influência da insatisfação com o trabalho, revela a complexidade dos fatores envolvidos no bem-estar desses profissionais. O estudo demonstra que a idade, insatisfação no trabalho, fatores genéticos, biológicos, ambientais, estilo de vida e adiposidade estão interligados com os sintomas depressivos.
O terceiro artigo da pesquisa: “Pandemia da covid-19, saúde mental, apoio social e sentido de vida em professores” Lopes & Novais (2023), descreve no quadro 3:
Fonte: Elaboração das autoras, baseado em Lopes & Novais (2023).
O estudo teve como objetivo analisar como os educadores percebem os efeitos da pandemia na saúde mental relacionada ao trabalho, no sentido de vida e no apoio social. Foi conduzida uma pesquisa de natureza qualitativa e mista, envolvendo 23 professores do ensino fundamental e médio das redes públicas da Bahia e Sergipe. Eles responderam a um questionário sociodemográfico e participaram de entrevistas semiestruturadas, respondendo a 21 perguntas. O roteiro das entrevistas foi revisado por três especialistas na área, que discutiram as perguntas apresentadas. Os tópicos abordados foram: saúde mental e trabalho; impactos da pandemia na saúde mental; uso de recursos tecnológicos; apoio social e sentido de vida.
Os principais fatores de adoecimento docente foram: Distanciamento social, adaptação da forma de trabalho/ensino remoto, aceleração tecnológica, apoio social entre professores, falta de sentido e conflitos com os alunos. Obtendo os seguintes sinais e sintomas: ansiedade, depressão, distúrbio no sono, alteração no comportamento alimentar, estresse, sensação de incerteza, tédio, medo, raiva, solidão, instabilidade, desamparo e desgaste.
A pesquisa examinou os impactos da pandemia da COVID-19 na saúde mental, no apoio social e no sentido de vida dos professores do ensino fundamental e médio. Os resultados revelaram uma série de desafios enfrentados pelos educadores, incluindo ansiedade, estresse e depressão, exacerbados durante a pandemia. O apoio social, especialmente o familiar, foi identificado como um recurso fundamental para enfrentar esses desafios. No entanto, a falta de apoio institucional destacou a necessidade de criar espaços de suporte dentro das escolas. Além disso, a pandemia trouxe à tona questões existenciais, desafiando os professores a refletirem sobre o sentido de suas vidas e sua responsabilidade diante das circunstâncias.
Os três artigos apresentam uma análise dos impactos das condições de trabalho na saúde mental dos professores, revelando uma preocupante realidade enfrentada por esses profissionais. O primeiro estudo traz à tona a precarização do trabalho, a desvalorização profissional e os conflitos no ambiente escolar como principais fatores de adoecimento, levando a sintomas como desmotivação e burnout. O segundo artigo explora a relação entre a insatisfação no trabalho e os sintomas depressivos, considerando a complexidade dos fatores envolvidos, como idade, estilo de vida e adiposidade. Por fim, o terceiro estudo foca nos efeitos específicos da pandemia sobre a saúde mental dos professores, destacando a relevância do apoio social e a reflexão sobre o sentido de vida diante do cenário vivido. Esses estudos, em conjunto, evidenciam a necessidade urgente de políticas e práticas que promovam um ambiente de trabalho mais saudável, valorizando o bem-estar dos educadores e mitigando os efeitos negativos dessas condições na qualidade de vida e no desempenho profissional.
A prática da docência na educação básica no Brasil é profundamente moldada pelo contexto social e político, levando muitos professores a enfrentar problemas de saúde devido a condições de trabalho adversas. Esses problemas não são apenas físicos, mas também mentais, resultantes de uma persistente sensação de desconforto, desilusão e frustração em relação ao trabalho. A falta de conexão com a profissão, a falta de incentivo e um sentimento de desesperança são fatores que contribuem para diversos tipos de adoecimento entre os docentes. Isso se tornou um problema de saúde pública, exigindo uma compreensão mais profunda das interações entre saúde, condições de trabalho e contexto político dos professores (Cunha et al., 2021).
Neste sistema capitalista, quando um trabalhador vende sua capacidade de trabalho, ele se torna uma mera extensão do capital, perdendo sua própria identidade e autonomia. Os trabalhadores são explorados e despojados de sua humanidade, enquanto o capital continua a acumular poder e riqueza. Isso afeta toda a classe trabalhadora, como podemos observar na diminuição do reconhecimento do papel dos professores na educação e no aumento da ênfase na formação de uma força de trabalho flexível, voltada principalmente para a empregabilidade. Essa tendência torna o trabalho dos professores menos significativo e tem um impacto adverso na saúde deles. De acordo com Trevisan (2022), à docência é a segunda categoria profissional, em nível mundial, a manifestar mais doenças de caráter ocupacional.
As recentes atribuições adicionadas, juntamente com a insuficiente remuneração e reconhecimento profissional, podem ser apontadas como determinantes para a exaustão física, emocional e psicológica enfrentada pelos educadores. Uma pesquisa conduzida pelo Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística Inteligência – IBOPE em 2018 entrevistou 2160 professores atuantes na educação básica, revelando que 49% deles desaconselhariam a carreira docente para os jovens. Apenas 23% expressaram recomendação definitiva, notadamente compostos em sua maioria por docentes em estágios iniciais da trajetória profissional. Os principais fatores que contribuíram para a não recomendação da profissão foram a escassez de valorização da carreira, a remuneração inadequada, a rotina exigente, as deficiências infraestruturais, questões familiares, o desinteresse discente e a baixa qualidade do ensino.
De acordo com Codo (1999), o professor se verá desafiado a enfrentar os enormes desafios da realidade laboral, possivelmente absurda. Sentira-se compelido a ser um verdadeiro herói, lutando contra os gigantes como violência, falta de recursos, falta de participação e baixos salários. Se ele não alcança sucesso, será rotulado como incompetente. Poucos reconhecerão o esforço emocional, afetivo e cognitivo que ele investiu para ser reconhecido como um bom professor. Os meios de comunicação destacam apenas a negligência da educação pública, o desempenho insatisfatório dos alunos nas avaliações do Ministério da Educação e a vergonhosa posição ocupada pelos estudantes brasileiros em comparação internacional. Essas críticas constantes à educação pública ferem profundamente a identidade do professor, colocando em dúvida sua competência.
O propósito de nossa pesquisa foi desenvolver uma reflexão crítica sobre como o sistema educacional tem funcionado no Brasil. No entanto, durante nossos estudos, observamos uma limitação na quantidade de pesquisas que abarcassem todo o território nacional, assim como uma escassez de bibliografia que oferecesse uma visão mais ampla e significativa sobre a saúde mental dos docentes em um panorama geral brasileiro nos últimos três anos, publicadas na Scielo. Em vista disso, concluímos que é necessário repensar a maneira pela qual a atividade laboral influencia a subjetividade do professor. Cabe reiterar, no entanto, que essa discussão não atravessa apenas a formação de educadores, mas também envolve diretamente a inserção da psicologia no debate. Isso se dá de forma explícita com a recente aprovação da Lei nº 13.935/2019, que prevê a contratação de psicólogos e assistentes sociais na educação básica. Essa lei representa um avanço importante na análise e intervenção sobre o mal-estar docente, ao garantir que as redes públicas de educação básica contem com equipes multiprofissionais para lidar com questões de saúde mental e social.
Além disso, as categorias científicas da psicologia têm se dedicado ao estudo desse mal-estar e esgotamento no campo educacional, entendendo-os como reflexos de forças e formas sociais que operam sobre os professores. Portanto, é crucial explicitar essa relação interdisciplinar, para que a análise não se restrinja apenas ao campo da formação de educadores, mas inclua também uma compreensão mais ampla das dinâmicas psicológicas e sociais envolvidas na saúde mental docente.
A trajetória da educação no Brasil pode ser dividida em dois períodos: antes e após a pandemia Covid-19. Antes da pandemia, os docentes já enfrentavam a necessidade de lidar com demandas sociais que permeavam o universo escolar, após a pandemia, entretanto, os professores passaram a competir com uma vasta gama de estímulos que disputam a atenção dos alunos em relação ao conteúdo acadêmico. Ao retornar a sala de aula o professor tenta voltar para um cotidiano que não existe mais, resultando em muito estresse, após quase dois anos o mundo mudou e o professor agora trabalha com a dificuldade de engajar os alunos nos conteúdos, nesse contexto se faz necessário trazer uma conscientização, maior para a saúde mental, e que o professor se volte para si, com mais consciência de prevenção, pois a saúde mental é um filtro com que interagimos com o ambiente, e preciso que o professor e todos que convivem no ambiente educacional, desenvolvam o autoconhecimento, trabalhando a empatia uns com os outros.
Faz-se necessário que as escolas priorizem uma cultura de promoção de saúde mental, fazendo periodicamente uma avaliação crítica a respeito do desgaste em relação ao trabalho laboral docente, avaliando as demandas de maneira equilibrada, um cuidado do outro praticando a empatia, e acima de tudo cuidando de si em primeiro lugar, o professor precisa avaliar suas emoções, reconhecer-se vulnerável e solicitar ajuda, admitindo suas fragilidades e assim avançar sobre o tema saúde mental saudável, resultando em reduzir os efeitos dos sintomas, ao primeiro sinal de estresse perceber como um alerta para o desconforto, nesse momento olhar entorno, identificar e avaliar as demandas do cotidiano, sendo atento a sua alimentação, sono, quantidade de ingestão de cafeína durante o dia, utilizando técnicas de respiração, que podem fazer diferença, investindo em medidas básicas e que competem somente ao próprio profissional.
Partindo da responsabilidade pessoal do profissional da educação, indo para esfera do que não é de sua competência, se faz necessário políticas públicas revendo questões salariais, carga horário de trabalho, condições e instalações da instituição, mais formação em demandas novas que surgem no contexto social e atravessa os muros da escola, repensar na liberdade do docente em transmitir seu conhecimento, a necessidade do profissional de Psicologia e Assistência Social dentro da instituição acadêmica, para que demandas que são inerentes a estes segmentos, não acabem sendo uma responsabilidade a mais para professor tendo lidar com algo que não faz parte de sua formação e responsabilidade profissional.
Concluímos, portanto, que a saúde mental dos docentes é um aspecto fundamental e ainda subvalorizado no contexto educacional brasileiro. A pandemia de Covid-19 intensificou os desafios enfrentados pelos professores, tornando evidente a necessidade de estratégias mais eficazes de cuidado com a saúde mental, tanto em nível individual quanto institucional. A valorização do autoconhecimento e da empatia, aliados a políticas públicas que considerem questões estruturais como salários, carga horária e suporte profissional, são elementos essenciais para um ambiente escolar mais saudável e equilibrado. Somente por meio de uma abordagem integrada, que inclua tanto a responsabilidade pessoal quanto às melhorias sistêmicas, será possível promover um espaço educacional onde o docente possa desempenhar suas funções com mais qualidade, reduzindo o impacto do estresse e proporcionando um ambiente de ensino mais produtivo e harmonioso.
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